"Respeito o tribunal e a decisão do veredito", disse Gisèle Pelicot numa declaração à imprensa à saída do tribunal, que condenou o seu ex-marido, Dominique Pelicot, a 20 anos de prisão, a pena máxima em França, por violá-la e drogá-la com ansiolíticos durante anos para ser violada por dezenas de desconhecidos recrutados na Internet, com idades compreendidas entre os 27 e os 74 anos.
Gisèle Pélicot, de 72 anos, que não se arrependeu de tornar o julgamento público desde o início em 02 de setembro, recordou as "vítimas não reconhecidas" da violência sexual, "cujas histórias permanecem muitas vezes na sombra" e "todas as outras famílias afetadas por esta tragédia".
"Quero que saibam que partilhamos a mesma luta", afirmou Gisèle Pélicot, referindo que agora tem "confiança" num "futuro em que todos, mulheres e homens, podem viver em harmonia, com respeito e compreensão mútuos".
A principal vítima do caso referiu ainda que travou "esta batalha" a pensar nos seus três filhos, noras e netos, agradecendo aos seus advogados e a todos os que a apoiaram, cujos testemunhos lhe deram "força para voltar todos os dias e enfrentar os longos dias de audiências".
No fim da audiência, os filhos do casal Pelicot declararam estar "desiludidos" com as penas dos 51 arguidos, considerando-as demasiado "baixas", segundo um membro da família Pelicot, que pediu o anonimato.
Todos os 51 arguidos foram considerados culpados, mas na maior parte dos casos com sentenças consideravelmente inferiores às exigidas pelo Ministério Público, que pedia no mínimo 10 anos de prisão.
As condenações variam entre os três anos de prisão, dois dos quais suspensos, e os 20 anos de prisão (dois terços dos quais sem possibilidade de liberdade condicional).
Todas as partes do caso têm dez dias para decidir se recorrem da sentença, o que implicaria um novo julgamento no Tribunal de Recurso de Nimes com um júri popular.
A Presidente da Assembleia Nacional francesa, Yaël Braun Pivet, agradeceu a Gisèle pela "sua coragem", referindo que através dela "as vozes de tantas vítimas estão hoje a ser ouvidas, a vergonha está a mudar de lado, o tabu está a ser quebrado".
"Gisèle Pélicot ficará na história como a encarnação do fim da vergonha para as vítimas e do fim da impunidade para os violadores", afirmou Mathilde Panot, presidente do grupo França Insubmissa (LFI, esquerda radical).
Também o chanceler alemão, Olaf Scholz, saudou a "coragem" de Gisèle Pélicot, que se tornou num ícone feminista mundial ao decidir tornar o julgamento público e assistir às sessões com o rosto descoberto "para que a vergonha mude de lado".
"A vergonha tem de mudar de lado. Obrigada, Gisèle Pelicot! Com coragem, saiu do anonimato para lutar pela justiça. Deu uma voz forte às mulheres de todo o mundo. A vergonha está sempre do lado do agressor", afirmou na rede social X.
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