Com a porta sempre entreaberta para um futuro entendimento pós-eleições, os líderes da AD e da Iniciativa Liberal procuraram, ainda assim, roubar votos um ao outro. Rui Rocha diz que traz a confiabilidade e o reformismo de que Luís Montenegro não deu provas. Já Montenegro alega que a IL falhou ao liberalismo.

Os líderes da AD e da IL estiveram, esta segunda-feira, frente a frente na RTP. Um debate em que o recandidato a primeiro-ministro recusou dever um pedido de desculpas ao país e cunhou um novo termo: a “Montenegrização” da oposição - que afirma, está a procurar aproximar-se dele.

Caso Spinumviva e governabilidade à direita

A governabilidade e os entendimentos à direita foram tema tanto logo ao início como no final do debate. Rui Rocha reconhece que os portugueses não estavam interessados em ir novamente para eleições - e diz que a IL “interpretou bem” o desejo dos portugueses, quando votou a favor da moção de confiança do Governo.

Apesar de acusar Luís Montenegro de ter gerido com “irresponsabilidade” o caso da Spinumviva – afirmando que “teria terminado o tema muito mais cedo”, estivesse ele no lugar do primeiro-ministro -, o líder da IL não fechou a porta a uma futura solução governativa entre liberais e a AD.

Rui Rocha garante que a Iniciativa Liberal “tem sentido de responsabilidade, tenha o PSD e Montenegro a capacidade de estar à altura dessa responsabilidade”. Um “desafio” que deixa, com todas as letras, a Luís Montenegro.

Ainda assim, não se coíbe de tentar levar votos do potencial eleitorado da AD. Diz-lhes que vale a pena votarem nos liberais porque têm o “espírito reformista” de que Luís Montenegro não deu mostras, ao mesmo tempo que promete recuperar “a dignidade e confiança nas instituições” e trazer a “estabilidade” que o líder social-democrata também não conseguiu.

“Está a AD e Luís Montenegro em condições de garantir essa estabilidade?”, questionou Rui Rocha. “A reposta é sim e é a forma de evitar um governo socialista em Portugal”, respondeu Montenegro, em contra-ataque.

“Quem vota na IL tem todas as razões para votar na AD, porque evita o regresso do socialismo”, reforçou.

Pedro Pina/RTP

O presidente social-democrata fez questão de enaltecer aqueles que considera serem os grandes feitos do atual Executivo – que, afirma, fez de Portugal um país “com estabilidade financeira que faz corar qualquer uma das grandes potências da Europa”.

Luís Montenegro rejeita aproximar-se dos socialistas e dos liberais e afirma que o movimento tem sido é o inverso. Fala mesmo numa “Montenegrização" do pensamento dos partidos da oposição, que, aponta, se têm aproximado das posições da AD.

“Hoje, quase todos os partidos acabam por concordar com as linhas orientadoras do governo”, afirmou.

Questionado se, como afirmou o ministro da Coesão, também ele conviveria bem com a IL no Conselho de Ministros, Luís Montenegro não é perentório. “Temos uma boa convivência em algumas matérias, mas também temos algumas divergências”, respondeu, apontando, por exemplo, não acreditar que “o mercado resolve tudo”.

Em relação ao Caso Spinumviva, Luís Montenegro foi chamado a responder se sente que deve algum pedido de desculpas aos portugueses. Algo que rejeitou. “Devo é capacidade de trabalho.”

Apesar de admitir que poderia sempre ter feito “algo de forma diferente”, o líder social-democrata garante que esteve “em exclusividade absoluta” e que não lhe pode ser apontada qualquer posição política tomada com inquinação da esfera privada.

Política fiscal e económica

Em suporte da teoria da “Montenegrização”, Rui Rocha foi confrontado com o facto de a IL se ter aproximado da AD, em termos fiscais, no programa que apresenta para estas eleições legislativas – e no qual deixar cair uma das medidas-bandeira que apresentava: a taxa única de IRS. Mas o líder liberal fugiu à questão.

Preferiu, em vez disso, falar da geração de “entalados” - que passou pela crise financeira, pela troika e pela pandemia- e que não é abrangida pelo IRS Jovem da AD. Para esses, afirma, houve uma “total ausência de soluções” a nível fiscal. O líder liberal aproveitou ainda para acusar Luís Montenegro de se ter encostado ao PS no Orçamento do Estado.

Em retorno, o presidente social-democrata sublinha que os impostos baixaram que a IL é que “falhou ao liberalismo” ao votar contra “o primeiro orçamento de que há memória em que não se aumentou um único imposto”.

Rui Rocha admite então que houve descida de impostos, mas refere que foi “muito ligeira” - e não o que “se espera depois de oito anos de governação socialista, e de um programa que apresentava a descida de impostos como prioridade”. Se fosse a IL governo, deixa claro, a descida de impostos seria maior e mais rápida. E assume como principal diferença entre os dois essa “diferença de velocidade”.

Pedro Pina/RTP

E se vier aí uma recessão? Foi a questão económica lançada de seguida. Como vão a AD e a Il adaptar-se? A hipótese foi, contudo, afastada por ambos os debatentes.

“Não temos essa expectativa”, declarou Luís Montenegro, argumentando que já em 2024 a situação internacional esteve conturbada e que Portugal soube resistir. “Confiamos na economia portuguesa”.

“Se Montenegro confia em Portugal, nos portugueses e nas empresas portuguesas, a IL confia ainda mais”, apressou-se, logo a seguir, Rui Rocha.

Insistindo no argumento da velocidade, afirmou: “Precisamos de acelerar o país para estarmos mais resilientes para o futuro”.

Saúde

No debate, houve ainda espaço para o tema da Saúde, introduzido pelo próprio Rui Rocha. O liberal acusou o Governo de falhar neste setor.

Questionado sobre se a proposta de modelo que a IL traz não vai criar “um sistema de saúde para ricos e outro para pobres”, Rui Rocha retorquiu: “Isso é o que temos agora”. Argumenta que “quem está na ADSE tem direito de escolha, quem tem poder económico para ter seguro de saúde tem poder de escolha”, enquanto os mais desfavorecidos ficam à mercê do SNS, “à porta do hospital, à porta do centro de saúde”.

Por sua vez, Luís Montenegro recusou que a Saúde tenha sido o grande falhanço do governo. Admitiu, contudo, que “as coisas não estão” como queria que estivessem, embora, alegou, estejam “melhores do que no ano passado”.

Em oposição à IL, disse não abdicar de que o Serviço Nacional de Saúde esteja no centro do sistema de saúde em Portugal – apesar das múltiplas PPPs que o Governo já anunciou.

E nem a propósito de decisões tomadas pelo atual Executivo, Montenegro foi também inquirido quanto à continuidade da ministra da Saúde, Ana Paula Martins, num eventual futuro governo. “É um quadro qualificadíssimo”, respondeu. "Em princípio, será eleita deputada, depois, veremos as nossas opções”.