
Já dizia o ditado que filho de peixe sabe nadar e a verdade é que Fernanda Torres é exemplo disso. Nasceu numa família de artistas e, ainda que tenha tentado fugir, a vida trocou-lhe as voltas. Desde cedo que começou a estudar teatro e com apenas 13 anos estreou-se nos palcos. Hoje, aos 59 anos, alcançou uma carreira de sucesso, tornando-se na primeira atriz brasileira a conquistar um Globo de Ouro.
Do cinema ao teatro, da televisão à literatura, Fernanda é uma mulher de vários ofícios… não fosse ela filha de Fernanda Montenegro e Fernando Torres, dois grandes nomes da representação no Brasil. Além da atriz, há também a escritora. Durante vários anos foi cronista na Folha de São Paulo e lançou três livros: Fim (2013), Sete (2014) e A glória e seu cortejo de horrores (2017).
Uma infância passada nos bastidores
Nasceu no Rio de Janeiro a 15 de setembro de 1965 cercada pelo universo artístico. Cresceu entre bastidores, palcos e câmaras… numa tentativa de estar mais perto dos pais.
“Cresci a ver os meus pais a ensinarem, eles tinham uma companhia de teatro. O meu pai era ator, diretor, produtor… e a minha mãe atriz. Eles liam aquelas coisas loucas lá em casa e isso era a minha vida”, disse numa entrevista ao programa “Lar: Vida Interior” .
A influência levou-a a entrar no Tablado, uma conceituada escola de atores brasileira, e a partir daí nunca mais parou. Aos 13 anos estreia-se no teatro com a peça "Um tango argentino" e dois anos depois na televisão. Em 1986, com apenas 21 anos, conquista o prémio de melhor atriz no festival de Cannes e torna-se na primeira brasileira a alcançar esse feito.
Consagrada dentro e fora do país, nos anos 90 começa a fazer mais televisão e nasce a Fernanda comediante. Desdobra-se entre a apresentação e a interpretação, e vai calcando um caminho que a leva às tão famosas Vani de “Os Normais” (2001 e 2003) e Fátima de “Tapas e Beijos” (2011 a 2015).
Apesar das duas séries já serem antigas, ganharam um novo interesse do público depois das nomeações internacionais.
“Ninguém escapou: é uma espécie de condenação nesta família"
Ser atriz foi a escolha, mas ainda chegou a ponderar outra profissão. Fernanda Torres já contou em entrevistas que quando era mais nova quis ser médica, mas os pais “forçaram-na” a seguir os passos da família: uns sapatos difíceis de calçar.
Para a filha, seguir a mesma profissão, significava ter de se igualar e viver (sempre) com sucessivas comparações.
“Naturalmente no início o cinema escolheu-me. Eu fiz uns quatro filmes seguidos e eles [os pais] não estavam no cinema. Então eu senti que era um lugar próprio (...) E eu não era para dar certo, não é, porque tenho o mesmo nome, eles fizeram essa loucura de me dar o mesmo nome (...) Então eu passei muito tempo a achar que a única solução para mim era ser a substituta da minha mãe e achava que se não estivesse a caminhar para isso ia falhar”, explicou no programa Roda Viva.
O refúgio da escrita
Começou a escrever como forma de aliviar o stress de uma profissão tão física como a de um ator. Lançou Fim em 2013, quando estava também a fazer "Tapas e Beijos", mas o reconhecimento na escrita já vinha de trás, uma vez que é, há vários anos, cronista na Folha de São Paulo.
“Depois quando escrevi o segundo filme já não estava a filmar, e aí senti o peso e a solidão do escritor porque tu acordas, vais para a frente do computador… começas quando o sol levanta e quando ele desce tu ainda não saíste dalí. Eu acho que uma profissão ajuda-me a descansar da outra de alguma maneira”.
Da literatura passou, também, para a escrita de roteiros. Escreveu para cinema e televisão e adaptou Fim para uma série minissérie de 10 capítulos.
"Ainda estou aqui"
Aos 59 anos, Fernanda Torres está na luta pelo Óscar de melhor atriz. Se conseguir, torna-se na primeira atriz brasileira a receber o prémio. E a verdade é que tudo isto podia não estar a acontecer se Mariana Lima tivesse aceite o papel de Eunice Paiva.
A atriz, também brasileira, de 51 anos, foi a primeira escolha de Walter Salles para protagonizar "Ainda Estou Aqui", mas acabou por recusar o papel. Esta oportunidade foi uma forma de Fernanda Torres regressar aos papéis dramáticos, depois de vários anos ligada à comédia.
“É claro que sou uma atriz dramática, mas fiquei mais conhecida por duas grandes comédias. Acho que fiz muita comédia para que o Walter pensasse em mim”, explicou à Variety.
Mas a verdade é que pensou e voltaram a trabalhar juntos, algo que já tinha acontecido em “Terra Estrangeira” (1995) e “O primeiro dia” (1998).
“Ainda estou aqui” representa, também, o regresso de mãe e filha ao mesmo ecrã. As duas já atuaram juntas por diversas, chegando mesmo a serem, também, mãe e filha na ficção. A primeira vez que se encontram foi na novela “Baila Comigo”, em 1981. Em 2020 fazem “Amor e Sorte" e “Gilda Lúcia e o Bode”.
Fernanda Torres: a rainha dos memes
Além do trabalho como atriz, é também uma figura conhecida pelos memes. Nas redes sociais, multiplicam-se... e para atriz até podia ser um problema, mas Fernanda prefere vê-lo de outra forma.
“Eu considero o meme uma expressão superior de arte. Amo. Fico orgulhosa cada vez que cavam uma cena minha e postam. Os memes são responsáveis pela minha sobrevivência com as novas gerações, jovens que foram apresentados à Vani e à Fátima, duas criações preciosas da televisão. Quando eu viro uma figurinha, então, lancem os foguetes”, disse em entrevista ao jornal “A Folha de São Paulo”.