
«Se não me engano, é o único clube do Brasil que tem um nome associado a um país. Há inúmeros emblemas que têm uma ligação com uma região ou com um estado, mas não com uma nação»
Foi desta forma que Alex Bourgeois, proprietário da Portuguesa, começou por explicar ao zerozero o que distingue o emblema de São Paulo dos demais.
O empresário, nascido em França, assumiu o leme da respetiva formação em 2024, na sequência de um processo de transformação do histórico clube para uma Sociedade Anónima de Futebol (SAF- correspondente a uma SAD em Portugal). Assim, para além das mudanças estruturais, a gerência tem demonstrado uma grande vontade de voltar a aumentar os elos de ligação entre os rubro-verdes e a comunidade lusitana, através de inteligentes campanhas de marketing.
O novo equipamento do Portuguesa é o mais recente exemplo desta mentalidade distinta, focada na unificação. À conversa com o nosso portal, Bourgeois abordou esta e outras medidas, com vista ao crescimento substancial da instituição nos anos que se avizinham.
Objetivo n.º 1: preservar a singularidade
Fundada em 1920, a Associação Portuguesa de Desportos é dona de uma história rica: no palmarés, os três troféus do Campeonato Paulista e a prestigiante Taça São Paulo saltam à vista. Como tal, após experiências administrativas no São Paulo e no Figueirense, a escolha de Alex Bourgeois quanto ao seu próximo desafio foi bastante fácil.
«Nós tínhamos muito interesse num clube que estivesse em São Paulo. Para além disso, queríamos fazer parte de um emblema que tivesse muita tradição e uma camisola pesada. Sabíamos que a Portuguesa era a equipa ideal, mas tínhamos plena consciência que muita gente tinha tentado comprar o clube, sem sucesso. A verdade é que ao olhar somente para o símbolo, todo o Brasil sabe quem é a Portuguesa. É uma equipa reconhecida no país inteiro», enalteceu.

Todavia, o gigante adormceido não gerava inveja no que diz respeito às instalações. O experiente proprietário confessou que as primeiras mudanças passaram por aprimorar as infraestruturas, que estavam longe de serem minimamente profissionais. Ao mesmo tempo que era implementada esta renovação física, a mentalidade retrógrada também era vista como matéria-prima, pronta a ser trabalhada.
«Queria tentar trazer ao de cima o lado especial da Portuguesa, relativo à grande ligação com Portugal. Aliás, a massa associativa do clube é puramente lusitana. É um caso muito raro. Por exemplo, o Palmeiras, originalmente, já foi um emblema apoiado, única e exclusivamente, por italianos. Agora, eu tenho amigos japoneses que são fanáticos pelo verdão. A cultura nas outras equipas do país alterou-se com o passar do tempo, mas a nossa permanece bem enraizada», referiu, de forma entusiástica.
Até no que toca ao futebol entre nações, a escolha dos simpatizantes fica bem patente: «Os adeptos da Portuguesa apoiam a seleção portuguesa e não a brasileira. No último Mundial, viam-se várias camisolas vermelhas por aqui. Nós usamos esta preferência a nosso favor. Por exemplo, quando Portugal venceu o Euro, em 2016, a Portuguesa lançou uma camisola especial, em tons de verde, procurando replicar o equipamento alternativo usado pelos campeões. Esta ideia causou furor junto dos adeptos.»
O equipamento que traduz um ideal
A cuidada atenção dada ao vestuário ainda se estende aos dias de hoje. No final de abril, o conjunto paulista decidiu lançar um equipamento alusivo à Batalha de Aljubarrota, na qual a armada portuguesa, com auxílio de aliados ingleses, venceram os castelhanos. Segundo o entrevistado, a homenagem visual ao feito de 14 de agosto de 1385 foi muito bem recebida pela Terra de Vera Cruz.
«Foi um autêntico sucesso! Aliás, muita gente que comprou a camisola não é sequer adepto da Portuguesa. Os brasileiros, de um modo geral, acharam a t-shirt absolutamente linda. Esta peça já tinha sido preparada pela gestão anterior, mas nós focamo-nos na parte da divulgação e na criação da campanha de marketing», ressalvou.
Cada moeda que entra nos cofres da Barcelusa é fundamental para o equilíbrio financeiro e, por consequência, para a concretização do primeiro objetivo delineado pela nova direção: a subida à terceira divisão. Na presente temporada, os verde-rubros arrancaram a Série D com o pé direito, liderando, atualmente, o Grupo 6 da prova. Com um plantel composto por alguns atletas experientes, como o matador Cristiano e a mota Iago Dias, a identidade lusa está (ligeiramente) presente no comando técnico.
«O nosso treinador Cauan de Almeida, apesar de ser brasileiro, foi formado em Portugal, na Universidade do Porto. Então, nós já temos algumas ideias do futebol português implementadas no nosso projeto. Toda a nossa metodologia de trabalho, bem como a visão tática e a preparação, têm origem na formação dele. Eu acho que os treinadores que usufruíram do ensino português trazem alguns fundamentos interessantes para o nosso futebol», salientou.
O ex-América Mineiro - com passagem como adjunto pelo Infesta - quer, certamente, apresentar resultados favoráveis, de forma a permanecer no posto durante vários anos. As expectativas para o futuro são altas; e que o diga Alex Bourgeois. Questionado sobre o degrau competitivo onde quer que o seu clube esteja daqui a cinco anos, o empresário gaulês foi perentório: «Primeira Divisão do Campeonato Brasileiro». Simples e direto.
«Iria acolher o Cristiano Ronaldo de braços abertos»
Num plantel tão vasto, estranha-se a escassez de jogadores lusitanos. Contudo, a inserção destes pupilos na longa aventura consta na lista de tarefas dos dirigentes: «Nós já estamos a pensar em trazer atletas portugueses para a disputa do próximo Campeonato Paulista, em 2026. Ainda estamos a analisar potenciais alvos, mas temos a plena consciência que queremos jogadores mais experientes, que possam trazer outras vantagens extracampo para o nosso clube.»

Entre o vasto leque de possibilidades, um nome bastante sonante tem sido associado ao Lusa do Canindé. Bourgeois aproveitou a oportunidade para colocar os pontos nos i's: «O Cristiano Ronaldo não é uma possibilidade como jogador. Nós não teríamos forma de pagar esse avultado investimento. Eu também acho que ele não teria qualquer interesse de jogar numa divisão tão abaixo.»
Porém, o empresário gaulês não descartou a hipótese do camisola '7' integrar o projeto com uma pele distinta: «Nós vemos com bons olhos a possibilidade de o ter como investidor, seguindo a filosofia que Ryan Reynolds implementou no Wrexham. Seria algo muito interessante para ele, já que iria reforçar muito a sua imagem aqui no Brasil. Iria acolhê-lo de braços abertos.»
Mensagem para os portugueses que habitam no seu país de origem? Ora aqui vai: «Talvez possa ser mais interessante apoiar uma equipa que tenha o nome do vosso país aqui no Brasil, em vez de puxar por um conjunto que joga na Inglaterra e na Alemanha. É uma sensação incrível apoiar as nossas raízes. Como tal, esperamos que Portugal seja uma peça essencial no crescimento da Portuguesa.»