As voltas à pista, a centrifugação de sentimentos, a condução à beira do abismo. Tudo são pequenos contributos para que uma overdose de emoções se insurja. Com a cabeça a mil, a boca diz o que quer e o que não quer. Ou o que quer e não pode.

As altas instâncias do desporto automóvel têm-se batido por uma Fórmula 1 ordeira e sem palavreado. Isso implica controlar a imagem passada pelos principais porta-vozes: os pilotos, que quando tiram o capacete e saem dos foguetes de quatro rodas, são o rosto da modalidade. Só que a postura protocolar desejada por quem manda parece nem sempre estar ao alcance dos corações quentes dos manobradores de volantes.

Este ano, a Federação Internacional do Automóvel (FIA) endureceu as sanções aplicadas aos pilotos que tenham comportamentos desviantes. O valor mínimo das multas para essas situações quadruplicou, estabelecendo-se nos 40 mil euros. Em caso de reincidência, o teto máximo do castigo pode atingir os 120 mil euros. Neste caso, o mais gravoso, podem inclusivamente ser adicionadas suspensões e deduções de pontos no campeonato.

As indicações dadas são para que a rédea seja curta nos casos em que os pilotos tenham responsabilidade sob “palavras, atos ou escritos” que afetem “o interesse do automobilismo e os valores defendidos pela FIA”. Do mesmo modo, são igualmente puníveis “comentários políticos, religiosos e pessoais” ou “qualquer má conduta”.

A malha apertada para desvios desagradou os pilotos, por vezes conduzidos pela emoção até à verborreia comunicacional empolada pela presença de microfones e câmaras. Apesar de tudo, na temporada 2025, ao contrário do que aconteceu na anterior, a mão parece estar mais leve quanto à aplicação das normas. Recentemente, no Bahrain, Carlos Sainz, piloto da Williams, usou a palavra “merda” quando estava a justificar o atraso para uma conferência de imprensa, mas escapou à multa.

No fim de contas, a FIA parece ainda estar à procura da melhor moldura penal para tais situações. O presidente do organismo, Mohammed Ben Sulayem, está a considerar “fazer melhorias” depois do “feedback construtivo” recebido por parte dos pilotos. “Os humanos fazem as regras e os humanos podem melhorar as regras”, explicou o dirigente num comunicado que urge como consequência de um diálogo de meses entre as partes.

Ainda assim, as desconfianças não foram dissipadas. George Russell, um dos dirigentes da Associação de Pilotos, menosprezou as declarações de Mohammed Ben Sulayem. “Essas palavras não significam nada até que mudanças sejam feitas.” Por sua vez, Lewis Hamilton reclamou um “lugar de poder à mesa” para que a “perspetiva dos pilotos” também possa ser tida em consideração.

O contexto para o escrutínio reforçado da FIA implica reler os capítulos anteriores. Em setembro de 2024, Max Verstappen vacilou no cuidado e proferiu alguns impropérios enquanto reclamava com um mau resultado no Azerbaijão. “O meu carro estava fo****”, disse quem viria a renovar o título mundial. Nessa ocasião, o neerlandês acabaria por receber uma multa e ser forçado a “realizar trabalho de interesse público”, algo que considerou “ridículo”. Pouco tempo depois, Charles Leclerc foi multado (€10.000, sendo €5.000 suspensos) por também ter recorrido ao vernáculo para explicar a prestação no GP do México.

No preâmbulo da nova época, em entrevista à Sky Sports, Max Verstappen mencionou “não ser necessário” qualquer reforço das sanções por parte da FIA. Acho que todos entendemos que, às vezes, no calor do momento, quando estamos a ser entrevistados, quando estamos no carro, há uma descarga de adrenalina e as coisas escapam um pouco.”

Logo em setembro de 2024, Mohammed Ben Sulayem repreendeu a normalização da linguagem descomplexada. “Não somos rappers.” Nesse momento, Lewis Hamilton considerou existir um “elemento racial” inerente ao reparo.