Cada campo de basquetebol tem uma porta giratória por onde entram e saem constantemente jogadores concebidos com uma notável capacidade atlética e altura, mas sem resistência para aguentarem 48 minutos de vaivém de um cesto ao outro. Com o frenesim de peças, os treinadores acrescentam frescura. Na maioria das situações, não há nada programado. A maneira de comprar mais tempo em campo é ser eficiente, porque na fase das decisões vão ser escolhidos os melhores.

Enquanto os titulares descansam, há quem tenha que render para aguentar o barco. É no momento em que a rotação começa que muitos assuntos se resolvem na NBA. Quem tiver mais opções habilita-se a encontrar no banco um inspirado que alivie a pressão das figuras principais. É tarefa exigente essa de substituir alguém sem que a equipa saia notoriamente enfraquecida, daí existir um reconhecimento para quem escamoteia o momento de revigorar as estrelas.

Ninguém na história da NBA tinha conseguido marcar 255 triplos a partir do banco como Payton Pritchard fez nesta temporada regular. Além disso, liderou a liga em pontos marcados como suplente esta época (14,3 de média). Foram estes argumentos suficientes para que o jogador dos Boston Celtics fosse eleito o “Sexto Homem do Ano”, logro que premeia o mais produtivo dos não-titulares.

O reconhecimento atribuído desde 1982/83 calha a alguém que não se limita a ser noite quando as estrelas entram em palco. São elegíveis para o prémio os jogadores que tenham entrado em campo mais vezes como suplentes do que como titulares. Não há ninguém que tenha recebido a distinção em tantas ocasiões (três) como Lou Williams. Este ano, a concorrer diretamente com Payton Pritchard, estavam Ty Jerome (Cleveland Cavaliers) e Malik Beasley (Detroit Pistons).

Quebrar muros com uma agulha

Em maio de 2025, Pritchard quebrou o recorde pessoal de pontos num só jogo, marcando 43 frente aos Portland Trail Blazers. Tudo na temporada do jogador de 27 anos foram máximos de carreira. Minutos: 28,4. Eficácia de lançamentos de campo: 47,2%. Eficácia de lançamentos de três pontos: 40,7%. A evolução não foi nada má face àquele rookie que não vislumbrava qualquer hipótese de ser opção regular em Boston.

No podcast “The Young Man and The Three”, Derrick White denunciou-o. O colega de equipa recordou que um dia viu Pritchard jogar um contra um frente a Neemias Queta nas áreas próximas do cesto. O caminho até se tornar “Sexto Homem do Ano” foi feito assim, derrubando muros com um alfinete. O base tem 1,85m, altura reduzida em comparação com a média. Ainda era mais baixo quando, aos 15 anos, passava as férias a defrontar Steve Blake, um jogador da NBA que era seu vizinho. “Provavelmente não ganhei um jogo nesse verão”, brincou no podcast oficial dos Boston Celtics.

Rio Giancarlo

Hoje em dia, no intervalo entre temporadas, Pritchard trabalha movido a apostas de 50 dólares que faz com os companheiros de treino contratados para o ajudarem. Os defensores escolhidos são propositadamente mais altos e mais pesados. O objetivo é passar por eles num curto espaço delimitado por cones e marcar. Fá-lo entre 300 a 400 vezes por sessão.

Bater com o nariz na porta as vezes que forem necessárias deu-lhe ferramentas para superar as diferenças que tem face os corpanzis da NBA. Fugir à fisicalidade moldou-lhe outros atributos, como a capacidade de lançamento longo. O buzzer beater que marcou do meio-campo tornou-se um dos momentos mais icónicos do título que os Celtics conquistaram em 2024.

No fundo, o papel de um suplente resume-se a “estar pronto a qualquer momento”, explicou no “The Young Man and The Three”. “Se temos mais minutos, temos que tirar vantagem e ajudar a equipa a ganhar nessa noite.” Não fosse o contributo de mais do que cinco jogadores e ganhar a NBA seria tarefa mais difícil para os Celtics. “Pomos a equipa à frente de nós mesmos. Esta equipa tem um monte de bons rapazes e todos têm isso.” Já dizia o chavão: não contes os teus minutos, faz os teus minutos contarem.