1- Com a votação final global na passada semana, chegou ao seu termo a verdadeira “novela” do Orçamento de Estado para 2025. Felizmente (eu diria mesmo, inevitavelmente) com a sua aprovação. A “estética” e a “coreografia” do sentido de voto dos diversos partidos parlamentares foram não apenas previsíveis, mas sobretudo as que correspondiam a uma compreensível ponderação sobre os ganhos ou perdas que para cada um poderia apresentar a votação final.
O futuro dirá se os portugueses ficaram a ganhar com a aprovação deste Orçamento. Afinal, os próximos anos podem vir a ser anos difíceis para Portugal e para a Europa, e, no que toca ao iminente 2025, a ver vamos quanto à sua robustez para manter o país na via do desenvolvimento, com finanças públicas saudáveis como tem vindo a ser a tendência. Aguardemos com optimismo.
A discussão orçamental teve temas que serviram de intenso debate ao longo dos seus quase três meses de discussão pública, fossem estes as pensões, as portagens, o imposto sobre o rendimento, etc. Na fase da sua discussão na especialidade foram apresentadas por todos os grupos parlamentares cerca de 2.100 propostas de alteração, das quais vieram a ser aprovadas apenas 243.
2- Não foi grande a discussão pública sobre o único dos erros ou “inconsistências” que o Governo reconheceu no seu orçamento. E foi quanto às verbas orçamentais destinadas às atividades relacionadas com o desporto. Recordo que a Proposta de Lei original destinava ao desporto um montante global de 42,5 milhões de euros, quando na mesma rubrica do OE 2024, ainda em vigor, se registavam 50,3 milhões. Seria que o Governo tinha intenção de baixar em 15,5% as verbas do setor desportivo?!
Mais inexplicável ainda era isto vir a acontecer depois de o primeiro-ministro ter anunciado um aumento de 20% para a subvenção aos programas olímpico e paralímpico. O que estaria ali de errado? Eu sempre afirmei, desde que tomei conhecimento de tal situação, que não acreditava que fosse intenção do Governo baixar as verbas para o desporto. Algo sucedera, talvez mesmo um simples erro de escrita ou de aritmética. Nada mais seria possível, e, por conseguinte, facilmente se resolvia com uma errata ou alteração que o Governo deveria apresentar antes da primeira aprovação na generalidade.
Mas isso não aconteceu. O executivo limitou-se a informar num comunicado ter havido uma “inconsistência”, especificando o terem “caído” duas ou três linhas orçamentais onde estaria o número desejado - não de 42,5 mas de 54,5 milhões de euros. E agora que a saga do OE chegou ao fim e o documento está finalmente aprovado, o Governo acabou por não mostrar onde estavam as linhas caídas, ou qual era a verdadeira fonte da inconsistência! Estranho, ou talvez não…
3- O que acaba por ser mais estranho ainda é que a alteração reclamada pelo movimento desportivo acabou por ser aprovada pela proposta apresentada pelo Partido Socialista e Iniciativa Liberal, que se adiantaram à proposta de alteração idêntica apresentada pelo PSD e PP. Foram dois partidos de oposição a vir resolver um problema ao Governo a que, tardiamente, os partidos no poder também acorriam a resolver! Tudo um pouco estranho...
Felizmente, o OE 2025 lá veio aprovar, mesmo que desta forma muito sui generis, os retificados 54,5 milhões de euros para o desporto. E a oposição, simpaticamente, não só concordou com o valor que o Governo disse que queria dispor para o desporto, como foi quem veio oficialmente propor tal valor. Nem mais nem menos! Exatamente o montante que o Governo tinha retificado em comunicado, nem um eurozinho a mais… Será que todos, governo e partidos de oposição, consideram que esse é o montante exato de apoio público de que o desporto precisa e merece?!
E o movimento desportivo, que eu não vejo em suficiente clamor, estará satisfeito e bem composto com a solução final do seu orçamento?! Ou o susto inicial foi tamanho que depois disso já se conforma com o resultado? Lembra as típicas promoções delirantes da decorrida Black Friday, em que o saldo nos parece tão grande e imperdível que nem reparamos no preço original inflacionado...
É bom que os portugueses saibam que o movimento desportivo tem razões de sobra para reclamar bastante mais apoio do que aquele que o Governo e a maioria parlamentar lhe destinaram neste OE para 2025. O financiamento público ao sistema desportivo anda, ainda hoje, por montantes equiparáveis aos de há 15/20 anos, e isto depois de sofrer uma descida acentuada após a Troika e a pandemia!
Com um financiamento público assim não se podem esperar ou exigir mais praticantes, mais treinadores, mais clubes, mais competições, mais taças e medalhas! E é isto que os portugueses, que ano após ano têm vindo a integrar progressivamente o desporto nas suas vidas pessoais e coletivas, reclamam dos responsáveis públicos, e que os agentes desportivos exortam a que aconteça.
Agora que a poeira da Black Friday orçamental assentou, importa que olhemos todos bem para os números reais e não nos deixemos iludir com ardilosos valores de saldo... É urgente colocar o dinheiro suado dos portugueses realmente ao seu serviço, em prol da sua qualidade de vida e da excelência a nível nacional. Ora, nada me parece mais simples do que reconhecer o papel e as necessidades do Desporto neste sentido.