
A deteção de possíveis sinais de vida na atmosfera do exoplaneta K2-18b, anunciada com entusiasmo por uma equipa da Universidade de Cambridge, está agora a ser contestada por novos estudos. Investigadores questionam a validade dos dados e alertam para a necessidade de mais observações antes de tirar conclusões.
Em 2023, cientistas da Universidade de Cambridge anunciaram que o Telescópio Espacial James Webb tinha detetado na atmosfera do exoplanetaK2-18b sinais de um possível oceano de água líquida - e possivelmente vida.
A "super Terra" situa-se na constelação do Leão, a cerca de 124 anos-luz da Terra, e orbita dentro da chamada "zona habitável" da sua estrela.
Os compostos químicos detetados - metano e dióxido de carbono - são frequentemente considerados indícios de processos biológicos, o que fez aumentar a especulação sobre a possível presença de vida.
"Indícios de possível vida extraterrestre"
Em abril passado, a mesma equipa liderada por Nikku Madhusudhan voltou a observar K2-18b com o JWST e anunciou no Astrophysical Journal Letters ter encontrado provas mais robustas: sinais de sulfureto de dimetilo (DMS) e dissulfeto de dimetilo (DMDS). Na Terra, estes compostos são produzidos quase exclusivamente por organismos vivos, sobretudo fitoplâncton marinho.
"Acredito que isto é o mais próximo que podemos chegar de uma característica que possamos atribuir à vida", declarou Madhusudhan, sublinhando, contudo, que seriam necessárias mais observações.
Falta de significância estatística levanta dúvidas
Apesar de os sinais parecerem mais claros desta vez, os dados ficaram aquém do limiar estatístico exigido para validar uma descoberta científica.
Desde então, astrónomos de várias instituições têm vindo a questionar as conclusões do estudo original. Entre eles estão dois antigos alunos de Madhusudhan: Luis Welbanks (Universidade do Arizona) e Matthew Nixon (Universidade de Maryland), que reexaminaram os dados utilizando outros modelos estatísticos.
Numestudo preliminar publicado no mês passado - ainda não revisto por pares - Welbanks e Nixon expandiram o leque de substâncias químicas que poderiam explicar os sinais detetados por James Webb, de 20 (no estudo original) para 90. Mais de 50 dessas moléculas produziram sinais compatíveis com os dados observados.
"Quando se deteta tudo, será que se está realmente a detetar alguma coisa?", questionou Nixon, em declarações à AFP.
Sem excluir a possibilidade de a atmosfera de K2-18b poder conter DMS, os dois investigadores acreditam que são necessárias mais observações.
Nova análise aponta para falta de bioassinaturas
Outro estudo, conduzido por uma equipa da Universidade de Chicago, combinou observações no infravermelho próximo e médio feitas pelo James Webb e não encontrou "evidência estatisticamente significativa para a presença de DMS ou DMDS".
Também o astrofísico Jake Taylor, da Universidade de Oxford, aplicou testes estatísticos independentes e chegou à mesma conclusão.
Madhusudhan rejeitou as críticas e considerou que os métodos usados por outros investigadores não têm em conta todos os fenómenos físicos relevantes. Acrescentou ainda que continua "tão confiante" nos seus resultados como há um mês.
Debate científico em aberto
"Este tipo de debate é saudável", disse Madhusudhan à AFP.
A sua equipa publicou recentemente uma nova versão preliminar do estudo, agora considerando até 650 moléculas diferentes. Entre as três mais prováveis continua a surgir o DMS — mas já não o DMDS, um aspeto chave que marcou o anúncio original.
Apesar do entusiasmo mediático, a deteção de bioassinaturas fora do Sistema Solar continua a ser um desafio técnico e estatístico. O método utilizado - espectroscopia de trânsito - depende de medir a forma como os gases da atmosfera de um planeta absorvem a luz da sua estrela. Os dados são frágeis e sensíveis a muitos fatores.
A comunidade científica acredita que os telescópios espaciais, como o James Webb, poderão um dia detetar sinais de vida extraterrestre com elevado grau de confiança.
"Mas precisamos de usar as estruturas existentes e acumular provas de forma fiável, em vez de apressar as coisas - como neste caso específico", salientou Nixon.