
Naquele que foi o último frente a frente para ambos, nestas legislativas, Paulo Raimundo e Inês Sousa Real não estiveram tão amigos como poderia ser esperado. No que toca ao ambiente, Raimundo puxou dos galões de ter um partido ecologista na coligação, mas o PAN apontou-lhe o dedo por não o acompanhar na censuraàprospeção do lítio. O embate aqueceu com o tema das touradas, com o PCP a propor a redução do IVA das corridas de touros e a defender o respeito por quem gosta da tradição, enquanto o PAN fala numa “batalha contra os animais”.
Também a política fiscal separou CDU e PAN, neste debate transmitido pela CNN Portugal. Quanto a soluções governativas, o líder comunista afirmou que só entrará numa nova "geringonça" se o PS tiver um programa diferente, enquanto a porta-voz do PAN afastou a hipótese de convergência com a AD de Luís Montenegro.
Jovens e política fiscal
Sendo uma força política antiga e com uma grande base de militantes antigos também, o PCP é, muitas vezes, associado à imagem de um partido envelhecido. Paulo Raimundo foi, por isso, questionado se, rejeitando medidas como o IRS Jovem, a CDU estava a assumir que não fala para esta franja do eleitorado. O líder comunista respondeu que a CDU fala é sobre “as questões centrais” - e que elas dizem também respeito as jovens.
“Falar sobre o combate à precariedade é falar para os jovens”, apontou. “Combater a especulação imobiliária é falar para os jovens”, continuou, assinalando que, mais do que benefícios fiscais, é preciso resolver o “problema central” dos salários.
Inês Sousa Real fala em preconceito ideológico dos comunistas e lamentou que o PCP não tenha acompanhado a proposta do PAN para rever o IRS Jovem, assim como a proposta de crédito bonificado para os jovens na compra de casa.
Paulo Raimundo explicou então que não apoia os incentivos para os jovens comprarem casa porque considera que estes beneficiam a banca. “Nunca é pedido nenhum esforço à banca”, notou, apontando que os incentivos que foram dados pelo atual Governo “foram comidos pelo aumento do valor das casas”, o que beneficiou ainda mais os bancos.
Como alternativa, sugere acabar por decreto com as comissões bancárias na aquisição de créditos-habitação.
Passando aos impostos sobre empresas, o líder da CDU criticou a descida do IRC, acusando o Executivo de Luís Montenegro - “com o apoio do PS” - de ter entregado “400 milhões de euros em benefícios fiscais”, sobretudo às grandes empresas.
Ora Inês Sousa Real, que também propõe uma descida do IRC, insiste que não se deve “diabolizar as empresas”.
A porta-voz do PAN rejeitou que o partido esteja a ser incoerente – uma vez que, com a descida de impostos, também poderão ser beneficiadas as empresas maiores e que mais poluem -, assinalando que defende também o fim das isenções sobre os produtos petrolíferos.
Proteção ambiental
Entrando nos temas core do PAN, Inês Sousa Real foi chamada a responder às acusações de fundamentalismo, por rejeitar a exploração de lítio em Portugal. A líder do PAN rejeitou as acusações e pinta a exploração de lítio como um "dano ambiental irreparável”, no caso de Boticas, por exemplo, apontando que estaria também a ser posto em causa o lobo ibérico.
O PAN defende que se faça uma avaliação de impacto ambiental adequada, com consultas públicas. Porque, afirma, “quem vai pagar esta fatura vão ser as populações” - ao nível do emprego, da extinção de pontos turísticos, e do desaparecimento de pequenos terrenos agrícolas, que são “fonte de subsistência de pequenos produtores e famílias”.
Inês Sousa Real voltou a lembrar que Portugal está atrasado na aplicação de fundos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) para a transição energética e critica a CDU por se autointitular “ambientalista” no Parlamento, mas chumbar as propostas ambientalistas do PAN.
“Temos de olhar para a realidade do nosso país, não é para o mundo como queríamos que ele fosse”, atirou Paulo Raimundo.
O líder da CDU defendeu que o país tem “o dever e o direito de conhecer os recursos que tem", mesmo que isso não signifique que vá explorá-los.
“Temos um plano de desenvolvimento para o país que não atropela nenhum progresso ambiental, pelo contrário”, assegurou o líder comunista, lembrando o partido ecologista que concorre coligado com o PCP e defendendo a importância do regresso d’”Os Verdes” ao Parlamento.
Touradas
Da proteção ambiental para a proteção animal, o tom subiu quando se chegou ao tema das corridas de touros. O PCP questionou a constitucionalidade das propostas do PAN, que quer referendar touradas. “Há coisas que não podemos arrumar por decreto ou à força”, atirou o líder comunista (que minutos antes tinha defendido o fim das comissões bancárias por decreto). A diferença, alega Paulo Raimundo, é que estamos perante “uma tradição”.
“Tradições só podem resolvidas por quem as cria. Foi o povo quem as criou, é o povo que vai acabar com elas”, declarou o secretário-geral comunista.
Sublinhando que respeita as opiniões diferentes sobre a matéria - “há quem goste, há quem não goste” -, Paulo Raimundo escolheu não revelar qual a sua posição pessoal sobre as touradas.
Mas para o PCP, garantiu, esta é uma questão secundária. “Não é a nossa prioridade”, frisou, acrescentando que está mais concentrado, por exemplo, na questão da guerra e do facto de haver quem queira mandar os jovens portugueses para lá.
Em resposta, Inês Sousa Real atirou com o facto de o PCP ter proposto a diminuição do imposto sobre as corridas de touros – falando mesmo numa “batalha contra os animais”.
A líder do PAN rejeita que o partido queira fazer uma “imposição ideológica”. A questão resume-se, defendeu, a “empatia e respeito com os animais” – citando o recém-desaparecido Papa Francisco para dar força o argumento.
Inês Sousa Real afirmou ainda que é redutor associar o mundo rural apenas às touradas e às caças e manifestou a convicção de que “uma larga maioria da população quer o respeito pela vida animal”.
Alianças governativas e combate à corrupção
No que diz respeito ao combate à corrupção, Paulo Raimundo disse apenas querer saber o que se passa em negócios que lesaram o Estado. Já Inês Sousa Real lembrou as propostas do partido sobre o lóbi e o registo de interesses e alertou que “Portugal perde 34 mil euros para a corrupção a cada minuto”.
“É importante por ao serviço do país todas as ferramentas para combater a corrupção, que suga dinheiro” para responder a outros problemas, referiu.
Quanto ao tema dos entendimentos com vista a soluções governativas após as eleições, Inês Sousa Real rejeitou que o PAN possa ser responsabilizado por não se colocar de um lado ou de outro da barricada.
A líder do partido animalista assegura que tem deixado claras “as linhas vermelhas” - e que é impossível convergir com o governo da AD, que acusa de ir contra a proteção animal (ao alinhar com as touradas e o abates em canis) e de dar burlas ficais a empresas que põem em causa a transição climática.
Ao invés de ser de “esquerda ou direita”, reafirmou que o PAN “tem colocado as causas ao centro do debate político” e que está “alinhado com as preocupações dos portugueses”.
Quanto a Paulo Raimundo – depois de associar frequentemente o PS ao PSD -, foi questionado sobre se, ao contrário de Jerónimo de Sousa, recusará uma futura “geringonça”.
Se for para resolver os problemas das pessoas, respondeu, a CDU “não faltará”, ressalvando, no entanto, o afastamento perante o PS atual.
“Nunca falhámos nas soluções, o PS é que mudou o seu programa, que não responde aos problemas”, declarou o líder comunista, terminando com um apelo à “participação massiva” nas comemorações do 25 de Abril.