O Tribunal Supremo do Reino Unido decidiu, esta quarta-feira, que a definição de mulher na legislação britânica sobre a igualdade de género deve ser baseada no sexo biológico, excluindo mulheres transgénero.

"A decisão unânime deste tribunal é que os termos 'mulher' e 'sexo' na Lei da Igualdade de 2010 se referem a uma mulher biológica e a um sexo biológico", anunciou o vice-presidente do tribunal de última instância, equivalente ao Tribunal Constitucional em Portugal, Patrick Hodge.

No entanto, salientou que o acórdão não deve ser visto como uma derrota dos ativistas dos direitos LGBT+, pois "a Lei da Igualdade de 2010 dá proteção às pessoas transgénero, não só contra a discriminação através da característica protegida da mudança de género, mas também contra a discriminação direta, a discriminação indireta e o assédio em substância no seu género adquirido".

A decisão, explicou, tenta encontrar um "significado coerente" para interpretar a legislação com antecedentes nos anos 70 do século XX para combater a discriminação sexual e que não foi afetada por legislação posterior sobre a mudança de sexo.

O caso conclui uma longa disputa entre uma organização de defesa dos direitos das mulheres e o Governo escocês, que defendia que uma pessoa transgénero com um certificado de reconhecimento de género como mulher poderia ser considerada uma mulher ao abrigo das leis da igualdade.

Disputa entre For Women Scotland e Governo escocês

A organização que interpôs o recurso, For Women Scotland (FWS), alegou que os seus resultados poderiam ter consequências a nível de todo o Reino Unido no que se refere aos direitos baseados no sexo, bem como em serviços como casas de banho e enfermarias de hospitais.

O caso decorre de uma lei de 2018 aprovada pelo Parlamento escocês que estabelece que deve haver uma representação feminina de 50% nos conselhos de administração dos organismos públicos escoceses.

Essa lei incluía as mulheres transgénero na sua definição de mulher.

O grupo de direitos das mulheres contestou com sucesso essa lei, argumentando que a sua redefinição de "mulher" ultrapassava os poderes do parlamento regional.

O executivo escocês emitiu então orientações segundo as quais a definição de "mulher" incluía uma mulher transexual que tivesse um certificado de reconhecimento de género.

A contestação foi rejeitada por um tribunal em 2022, mas o grupo obteve autorização no ano passado para levar o seu caso ao Supremo Tribunal.

J.K. Rowling apoiou a organização

O grupo de defesa dos direitos das mulheres contou entre os seus apoiantes com a escritora J.K. Rowling, que terá doado dezenas de milhares de libras para apoiar o seu trabalho.

A autora de "Harry Potter" tem defendido com veemência que os direitos de pessoas transgénero não devem ser concedidos à custa das mulheres.

Stuart C. Wilson

Fundada em 2018, a organização descreve-se como "um grupo de mulheres que trabalham para proteger e reforçar os direitos das mulheres e das crianças", mas os críticos consideram-na transfóbica.

No lado oposto, organizações LGBT+ e a Amnistia Internacional argumentaram que impedir as pessoas transgénero que possuem um certificado de reconhecimento do sexo de beneficiarem de proteção contra a discriminação sexual é contrário aos princípios dos direitos humanos.

Questão sobre definição de mulher foi tema de debates eleitorais em 2024

A questão sobre a definição de mulher esteve presente nos debates eleitorais de 2024, mas entretanto quase desapareceu da agenda política após a vitória do Partido Trabalhista.

Em 2022, o governo escocês aprovou uma lei para facilitar a mudança de género, permitindo fazê-lo sem aconselhamento médico e a partir dos 16 anos.

Perante a controvérsia, a lei acabou por ser bloqueada pelo Governo central de Londres, quando os conservadores ainda estavam no poder.

Em janeiro de 2023, as autoridades escocesas tiveram de anunciar a suspensão da transferência de qualquer preso transgénero com antecedentes de violência contra as mulheres para uma prisão feminina, depois de dois casos terem chocado a opinião pública.

- Com Lusa