Numa videoconferência com deputados do grupo Renew (que inclui a Iniciativa Liberal), realizada no Parlamento Europeu, em Estrasburgo, Mondlane disse que hoje o Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, o contactou, por telefone, "pela primeira vez desde o início das manifestações, há dois meses", mas escusou-se a adiantar detalhes sobre a conversa.

Em 26 de novembro, o chefe de Estado moçambicano convocou uma reunião com os quatro candidatos às eleições gerais, mas Mondlane não participou e foi decidido convocar um segundo encontro para que ele pudesse estar presente.

"Estou profundamente convencido de que o Presidente Nyusi quer permanecer no poder. Ele espera que eu incentive as pessoas a fazerem manifestações violentas para ter uma razão para declarar estado de emergência e assim poder permanecer no poder mais algumas semanas", afirmou Mondlane, que rejeita os resultados das eleições gerais de 09 de outubro anunciados pela Comissão Nacional de Eleições.

Este órgão atribuiu a vitória a Daniel Chapo, candidato suportado pela Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), partido no poder, mas os resultados ainda têm de ser validados pelo Conselho Constitucional (CC).

Para contestar os resultados oficiais, Venâncio Mondlane tem convocado manifestações e paralisações em que, segundo a Plataforma Eleitoral Decide, que monitoriza os processos eleitorais em Moçambique, já morreram pelo menos 130 pessoas e 385 foram baleadas.

De acordo com o balanço daquela organização não-governamental, com dados até 15 de dezembro, há registo de 3.636 detidos, cinco pessoas desaparecidas e mais de 2.000 feridos.

O anúncio do CC sobre os resultados das presidenciais é esperado na segunda-feira e Venâncio Mondlane admite que os protestos possam tornar-se mais violentos, embora recuse fazer esse apelo.

"Até agora, a situação tem estado sob controlo, procuramos que os protestos decorram dentro do direito constitucional à manifestação", considerou, acrescentando: "Não sei o que acontecerá depois do anúncio dos resultados finais, acredito que o povo vai assumir por si próprio o que quer fazer".

O candidato admite não estar otimista e acusa o Conselho Constitucional de adotar "atividades políticas para manipular a opinião pública", denunciando "uma situação muito perigosa para o país".

"Vai ser uma situação difícil de lidar porque as pessoas vão entender que é a última fase e estão neste momento muito atraídas para medidas mais agressivas e intensas", antecipou.

Esta posição, ressalvou, "não é um convite para o caos", recusando estar a condicionar o anúncio do Constitucional que, disse, "tem o futuro do país nas suas mãos".

"Não tenho ideia de quais serão os meus próximos passos. Fiz o meu papel, fiz o melhor até agora", comentou.

Mondlane permanece fora de Moçambique, o que justificou com apelos de "milhares de moçambicanos", que lhe disseram que era "mais útil ao país estando vivo", recusando revelar a sua localização.

"Sou um cidadão do mundo", ironizou, afirmando estar constantemente a "cruzar fronteiras" porque tem detetado "tentativas de violação" da sua vpn (rede de comunicações privada), o que permitiria localizá-lo.

O candidato escusou-se também a revelar quando regressará ao país, mas exprimiu o seu "profundo desejo de voltar a casa", e disse que o seu plano depende do anúncio dos resultados pelo Conselho Constitucional.

"De uma forma ou de outra, eu quero fazer algo com um significado simbólico forte. Quero tomar posse no dia 15 de janeiro", reiterou.

Questionado sobre o papel da comunidade internacional na crise social e política que Moçambique vive, Mondlane lamentou que os moçambicanos estejam "entregues à sua sorte".

Portugal tem feito "uns pronunciamentos formais, [no sentido] da paz, muito no plano do politicamente correto", considerou.

A União Europeia "está um pouco a hesitar", disse, afirmando-se "muito zangado com a União Africana".

"Não estou satisfeito. Há pessoas a morrer, milhares na prisão, pessoas raptadas. É como se estivessem a ver televisão, é preciso fazer algo mais", apelou.

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