Justin Welby renunciou esta terça-feira ao cargo de arcebispo de Cantuária, o mais alto responsável espiritual da Igreja de Inglaterra, chefiada pelo rei Carlos III. Welby fá-lo após críticas por não ter exposto à polícia informação que lhe chegou sobre John Smyth, advogado e cristão evangélico canadiano que cometeu abusos sexuais no âmbito da igreja anglicana.

Uma investigação da própria igreja apurou que os “horrendos abusos” de Smyth poderiam ter sido denunciados em 2013, quatro anos antes do que foram, caso Welby tivesse contactado as autoridades, escreve o diário londrino “The Telegraph”.

O chamado relatório Makin concluiu que a inação do arcebispo permitiu a continuação de alegados crimes cometidos ao longo de décadas por Smyth, já falecido, que terá cometido abusos sexuais, físicos e psicológicos contra mais de 100 crianças na qualidade de diretor de um acampamento cristão.

Welby assume, em comunicado, a obrigação de “tomar responsabilidades pessoas e institucionais”. Atrasou, com a sua inércia, a ação judicial contra Smyth. Mais de 3600 pessoas tinham assinado uma petição eletrónica, coordenada por membros do sínodo ou assembleia da comunhão maioritária no Reino Unido, pedindo a sua demissão imediata.

Além de uma carta aberta publicada no sábado passado, a bispa de Newcastle, Helen-Ann Hartley, tornou-se a pessoa mais importante a pedir a demissão de Welby. O próprio primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, absteve-se de defender o arcebispo. “Vou ser claro: do que sei das alegações, são claramente horripilantes no que toca a este caso particular, quer na escala quer no conteúdo. Os meus pensamentos, como em todos estes assuntos, estão com as vítimas, a quem, como é óbvio, se falhou de forma muito, mas muito má. Afinal de contas, é assunto para a igreja, mas não vou fugir a dizer que estas alegações são horripilantes e que os meus pensamentos estão com as vítimas”, disse o chefe do Governo trabalhista.

Welby reconheceu na semana passada que deveria ter agido quando soube do comportamento de Smyth, que morreu na África do Sul em 2018, já com a investigação em curso. O promotor de acampamentos é considerado o pedófilo mais prolífico associado à Igreja de Inglaterra, o berço do anglicanismo no mundo.

O padre Giles Fraser, ele próprio vítima de abusos quando criança, disse à emissora estatal BBC que Welby “perdeu a confiança do clero”, enquanto Hartley advertiu que será difícil “continuar a ter uma voz sobre moralidade” se o arcebispo permanecesse aos comandos.