

O Bola na Rede apresenta a primeira entrevista de Francisco Alves Rito, após ter tomado posse como presidente do Vitória FC. Em análise está o futuro do clube de Setúbal, os desafios do PIR e as metas estabelecidas para uma derradeira tentativa de salvação emblema sadino.
Podes ouvir a entrevista completa em baixo:
Bola na Rede: Francisco, muito obrigado por estar connosco neste espaço de entrevista do Bola na Rede. Antes de avançarmos para questões mais complexas, ia-lhe pedir, do ponto de vista do adepto do Vitória FC, o que pode o adepto esperar Francisco Alves Rito e quem é Francisco Alves Rito?
Francisco Alves Rito: Eu sou jornalista de profissão, formado, licenciado e mestre em Direito, pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Tenho sido jornalista toda a vida, há 30 anos que tenho carteira profissional. Já colaborei com os maiores grupos de comunicação social e, atualmente, ainda colaboro com o jornal Público e sou diretor do jornal “O Setubalense”, o mais antigo de Portugal Continental, faz 170 anos neste ano. É um diário regional em papel. Sou alentejano, sou casado, tenho três filhos, resido em Setúbal há muitos anos. Nasci em Estremoz, mas vim para Setúbal com poucos meses de idade. Tenho vivido aqui toda a vida. O que podem esperar de mim? A maior dedicação, honestidade e transparência na gestão do clube. Creio que os órgãos sociais têm muito boas capacidades técnicas e pessoais para formarem um grupo de trabalho muito coeso e muito capaz. Aliás, creio que isso tem estado à vista nesta primeira de semana e pouco de mandato. Porque a dinâmica que já conseguimos imprimir creio que é visível para todos os vitorianos. Há dinâmica dos núcleos internos e na gestão do clube. Creio que, quem está nessa condição, já percebeu que há muita coisa a ser feita em simultâneo e muita gente empenhada. Há muitas coisas a acontecer. Quanto ao público externo, creio que é percetível também o forte ritmo e intensidade que estamos a colocar e penso que também a assertividade neste grupo de trabalho. Há um esforço para a aproximação do Vitória FC à cidade. Entendemos que é o Vitória que tem de ir ao encontro da Cidade e não ficar sentado em cima dos seus 114 anos à espera que seja à cidade a vir à sua procura. Estamos a dar passos nesses sentido. Por exemplo, haverá uma grande festa neste domingo, na receção ao Barreirense [jogo já decorreu: Vitória FC venceu Barreirense B por 8-0]. O Estádio do Bonfim vai estar em festa desde o meio-dia, com uma fan zone nas imediações do estádio. Vamos ter comes e bebes, vamos muitos artistas e um programa de animação musical até às 20h, com muita animação. O estádio terá as portas abertas aos jovens estudantes de Setúbal com cartão de estudante. Queremos ter uma assistência de 5 mil pessoas no estádio e isto mostra o que está a ser feito em muito pouco tempo. No domingo terão oportunidade de comprovar, vamos ter um dos dias mais animados na cidade em termos da força vitoriana.
Bola na Rede: Olhando para o momento em que avançou para as eleições do Vitória FC. Pergunto-lhe, antes de mais, o que é que o moveu para avançar neste momento em específico?
Francisco Alves Rito: Já tenho estado ligado à vida social do Vitória FC desde 2020. Participei, com outras pessoas, num movimento que procurou estabilizar o clube do ponto de vista social. Procurámos uma paz social entre os sócios e vínhamos de mandatos muito curtos e de listas, ou direções, que deixavam muito a desejar. Queríamos maior consenso e unidade para a família vitoriana. O meu papel foi o de ajudar nesse movimento. Posso dizer que liderei esse movimento e, como mandatário da lista única de consenso e salvação, fui mandatário e, a partir daí, continuei a ser mandatário das listas seguintes. Continuámos nesse espírito de haver apenas uma lista. Esses órgãos sociais atingiram o seu limite em relação ao desgaste. Estiveram quase cinco anos à frente do Vitória FC, manifestaram o desejo de sair e percecionei, com um conjunto alargado de sócios, que deixaríamos de estar nessa questão do consenso e que iriam aparecer listas. A ideia é a de que poderiam aparecer listas que não asseguravam a continuidade da estabilidade no Vitória FC. Há muitos grupos e várias tendências e havia até de aparecerem algumas listas que, além de serem um enorme ponto de interrogação, algumas assustavam um pouco os sócios. Houve um grupo de pessoas que me pediu para ser cabeça de lista de uma lista e eu acabei por aceitar por achar que o clube precisava. Estamos num momento de viragem que não pode ser desperdiçado. Temos de agarrar esta oportunidade, que pode ser a última, para colocar o Vitória FC num caminho de ascensão rumo ao lugar, que é o seu no futebol português, que é a Primeira Liga. Foi isso que me motivou. Desde esta preocupação genérica a uma preocupação especial que eu tenho, que é a continuação do clube enquanto entidade de utilidade pública desportiva. O Vitória FC é um clube eclético tem uma dezena de modalidades onde há um universo de milhares de crianças e jovens que ainda é mais significativa em termos demográficos. Se somarmos as famílias dos atletas… O Vitória FC tem de continuar a cumprir o seu papel de entidade promotora do desporto na cidade e na região. Ir ao Estádio do Bonfim e ver as imediações com modalidades a funcionar com crianças e famílias dá-me uma enorme alegria. Temos de garantir que esse serviço público continua a ser prestado e procurar as condições em que ele é prestado. Procurarmos, nós direção, proporcionar aos atletas, estas modalidades amadoras que têm as melhores condições para desempenharem as suas funções para cumprirem esta tão nobre missão que o clube continua a desenvolver aqui na cidade.
«O Vitória FC é um clube eclético tem uma dezena de modalidades onde há um universo de milhares de crianças e jovens que ainda é mais significativa em termos demográficos».
Bola na Rede: Ainda em relação às eleições: sente que o diferenciou a sua candidatura, face à do Fernando Belo, que tinha o apoio do Edinho, é a rotura do passado. Também se falou do apoio do Paulo Grencho. Acha que este fator de se sentir que é uma candidatura nova com raízes cortadas, fez também a diferença para ganhar as eleições?
Francisco Alves Rito: Penso que esse fator de distanciamento, tanto estava numa lista, como estava na outra. Em qualquer um dos casos, são pessoas novas que não estiveram nos órgãos sociais e de gestão nestes últimos mandados, embora, quer de um lado, quer do outro, existam pessoas que tiveram participação. Eu tive participação, fora dos órgãos sociais, apenas fui mandatário. Da parte da outra lista, o engenheiro Fernando Belo, foi também vice-presidente do Vitória. Sobre um grupo novo, uma renovação… Penso que existia dos dois lados. O que fez diferença foi o que apresentámos em termos da capacidade da lista e linhas principais de orientação. A nossa lista tem pessoas que reputo com a maior competência para o desafio que temos pela frente. Um nível geral de qualidade superior na nossa lista, comparativamente com a outra, com o devido respeito. E um outro fator, que enunciei ao início, que é a filosofia estratégica que defendemos para o Vitória. Esta é uma lista, agora com órgãos sociais, que assentam a sua ação na razão e temos uma filosofia de racionalidade e que a nossa primeira preocupação é o saneamento financeiro do clube, garantir a sustentabilidade da operação corrente e resolver o problema do passivo. Não tanto o futebol… Pelo que percebemos, tal como os sócios, a outra lista tinha muito menos foco nesta parte institucional e mais foco no futebol. Daí ter alguns nomes ligados ao futebol. Em síntese, tínhamos aqui um confronto entre a razão e a mera paixão. Creio que os sócios valorizaram esta perspetiva de que o Vitória FC precisa de pensar, de fazer as coisas com cabeça, não perder de vista a nossa paixão pelo futebol e a ambição que temos de voltar à Primeira Liga, mas é preciso ter a noção clara de que antes de chegarmos a esse telhado, temos de construir os alicerces e ter capacidade para o fazer.

OBJETIVOS DO PROJETO A CURTO E MÉDIO PRAZO
Bola na Rede: Foi eleito há sensivelmente duas semanas. Pergunto-lhe quais é que são os principais objetivos nesta fase inicial do trabalho?
Francisco Alves Rito: Temos objetivos em duas dimensões: temos o objetivo de assegurar a resolução do problema económico-financeiro do Vitória. Há um contrato de promessa de compra e venda e um projeto imobiliário que é a âncora para resolver os problemas económico-financeiros do Vitória e relançar o clube para uma aposta desportiva que lhe permita regressar aos lugares onde deve estar. E esta primeira vertente de viabilização e do projeto imobiliário é a nossa primeira prioridade. Estamos a trabalhar nessa matéria e penso que estamos a trabalhar muito bem. A outra área em que também nos estamos a concentrar é a de assegurar a operação corrente do clube. O funcionamento de todas as modalidades e departamentos com a maior estabilidade possível. Assegurar para as pessoas que estão à frente dos diversos departamentos e modalidades que têm a nossa confiança e que estamos a trabalhar com eles. E, mais do que isso, criar condições para que nada falte e a operação que vinha a ser desenvolvida pode ser continuada e até fortalecida.
Bola na Rede: Olhando um bocadinho para dentro das quatro linhas. Qual é o objetivo real do Vitória FC para esta temporada e para os próximos anos?
Francisco Alves Rito: O objetivo desta temporada é sermos campeões da segunda divisão distrital da Associação de Futebol de Setúbal. Creio que estamos no bom caminho para atingir esse feito. O clube tem tido excelentes resultados com poucas derrotas e poucos empates. Com vitórias muito volumosas. Temos uma diferença pontual na tabela classificativa que nos dá a perspetiva de, olhando para o que temos feito e para a capacidade da nossa equipa e para o que resta do campeonato, para acreditarmos de que vamos conseguir o objetivo de sermos campeões neste ano. Para os próximos anos, o objetivo genérico é subirmos todos os anos. De forma consecutiva. Para isso, pretendemos ter agora, no próximo ano, em que vamos estar na primeira divisão da Distrital, se tudo correr como o planeado, um plantel com condições que sejam já muito próximas do Campeonato de Portugal. Queremos ter o orçamento, uma equipa e um grupo de trabalho que pudessem até disputar o Campeonato de Portugal. A nossa intenção é andar um ano à frente daquele em que estamos desportivamente. Em termos de preparação, estar um ano à frente. Queremos construir para o próximo ano um grupo já com muita coisa do Campeonato de Portugal. Isto para termos alguma garantia de trabalho continuado, de estabilidade na continuidade, mas também de capacidade de técnica. Se tivermos uma equipa mais próxima do Campeonato de Portugal, temos mais garantias de fazer um bom campeonato e também já estamos a construir aquilo que será a base do ano seguinte para haver maior estabilidade, quer pela continuação de alguns elementos, quer noutros aspetos mais burocráticos.
«O objetivo desta temporada é sermos campeões da segunda divisão distrital da Associação de Futebol de Setúbal. Creio que estamos no bom caminho para atingir esse feito».
Bola na Rede: O Francisco, e a restante direção, terminará o mandato em 2028. Onde é que espera que o Vitória FC esteja nesse momento?
Francisco Alves Rito: Estamos a falar daqui a três anos. O que queríamos era cumprir este objetivo de subir todos os anos. Isso dará qualquer coisa como estarmos no Campeonato de Portugal ou a subir para a Liga 3. É por aí.
Bola na Rede: Num primeiro momento em que foram convocadas eleições, não surgiram candidatos [20 novembro]. Entretanto, apareceram duas listas para concorrem ao Vitória FC. O que sente que mudou?
Francisco Alves Rito: O que mudou, da nossa parte, foi termos percebido que poderia não haver uma geração de listas ou de órgãos sociais com a capacidade à altura dos desafios que o Vitória apresenta. Nós percebemos que havia um vazio, não havia quem se quisesse candidatar e isso fortaleceu o apelo que nós sentimos para darmos o passo que o Vitória precisa. Por outro lado, esse mesmo facto de não ter havido eleições a dia 20 [de novembro], gerou depois, não sei se pelas mesmas razões ou por razões… Não lhe quero chamar oportunismo, mas de avaliação de que poderia haver uma maior facilidade em alcançar a liderança do Vitória, houve alguns grupos de pessoas e de associados que começaram a movimentar-se no sentido de formarem uma lista. E isso, para este grupo que avançou e ganhou as eleições, soou como também um risco. Reconhecemos que qualquer associado pode ser candidato ao Vitória, olhando objetivamente para algumas das movimentações que estavam à acontecer, e não me estou a referir à lista B, foram algumas que não avançaram e podiam ter avançado, suscitaram-nos alguma preocupação para que o Vitória FC não ficasse bem entregue e em boas mãos.
PROBLEMA FINANCEIROS DO VITÓRIA FC
Bola na Rede: Francisco, é inevitável não falarmos do PIR [Plano de Insolvência e Recuperação de Empresas]. Já é um tema recorrente na vida dos adeptos do Vitória e por isso pergunto-lhe: em termos gerais, até porque já foi uma questão muito aprofundada nas eleições, e agora que já está no clube: ao dia de hoje, quais é que são os planos que o Vitória FC tem e como é que pretende que o Vitória FC cumpra este plano?
Francisco Alves Rito: Ao dia de hoje, o Vitória FC está a cumprir integral e pontualmente todas as suas obrigações com o PIR. Mesmo a prestação deste mês de março, já estão as prestações pagas. O Vitória tem uma solução para enfrentar este PIR que é o projeto imobiliário. Tem um potencial de geração de proveitos para o Vitória de 25 milhões de euros e nós estamos a falar de um PIR em que a dívida somada são cerca de 9,3 milhões de euros. Portanto, há aqui, teoricamente, uma grande capacidade do Vitória para cumprir com este plano. A dificuldade que existe é, na prática, com a velocidade a que isto é desenvolvido. O PIR já está fixado que tem as suas mensalidades definidas, enquanto que a execução do projeto imobiliário tem um ritmo diferente, até pelas condições de ser um negócio dessa natureza. Sobretudo pelos procedimentos administrativos e urbanísticos. O que temos contratado no âmbito do projeto imobiliário é um contrato de promessa de compra e venda com um investidor e ao abrigo desse contrato, esse investidor tem a obrigação de suportar os encargos das obrigações do PIR, algo que tem feito. Depois de o projeto imobiliário estar licenciado, será feita a escritura e aí o Vitória já terá a capacidade financeira para resolver o PIR de uma única vez, após estas mensalidades terem sido pagas e ainda terá mais músculo financeiro devido a esse projeto. Quanto aos procedimentos administrativos, o ponto em que estamos é da apreciação do PIP [Pedido de Informação Prévia]. O Vitória já entregou o PIP na Câmara Municipal há cerca de uma semana, na Câmara Municipal de Setúbal. Temos a expectativa de que o PIP possa ser aprovado pela autarquia em dois meses e, a partir daí, pode iniciar-se o licenciamento com base no qual será feita a escritura de compra e venda destes ativados. Acreditamos que pode ser aprovado à primeira, não obstante de precisar de ter de ser obtido um parecer favorável de muitas entidades da administração pública que estarão envolvidas. Mas o PIP foi desenhado a cooperação da Câmara Municipal de Setúbal, com pessoas extramamente conhecedores e competentes nestas matérias. Acreditamos que está em condições de poder merecer aprovação e pareceres positivos de todas as atividades envolvidas e, em última instância, da Câmara Municipal para aprovar este PIP. O que vos posso dizer do projeto imobiliário é que, além de ser essencial para a viabilidade do clube, presente e futuro, é também um projeto de um novo estádio para o Bonfim. Um projeto que pode dar uma nova vida e uma centralidade a esta zona da cidade. O estádio atual está muito deteriorado, quer em termos do conforto para os eventos desportivos, quer em termos de fixação para comércio e serviços. Achamos que temos um projeto que responde muito bem a todas essas valências e está ao nível do que o Vitória precisa. O estádio terá lugares suficientes para os campeonatos nacionais e internacionais, desde logo, da UEFA. Em termos de equipamento urbano, terá também uma série de valências que vão valorizar a cidade naquela zona do Bonfim.
«O PIR já está fixado que tem as suas mensalidades definidas, enquanto que a execução do projeto imobiliário tem um ritmo diferente, até pelas condições de ser um negócio dessa natureza. Sobretudo pelos procedimentos administrativos e urbanísticos».
Bola na Rede: Nos últimos meses surgiram notícias de riscos de insolvência, de uma refundação e houve até a tal notícia sobre o Vit SAD. No fundo, surgiram aqui indícios de preocupação para o Vitória FC. Pergunto-lhe que erros estratégicos é que foram cometidos no passado e o que é que tem de ser evitado para que não repitam erros idênticos?
Francisco Alves Rito: Quanto ao passado há dois tipos de erros: há uns que são mais fáceis de referir e há outros que são mais difíceis porque… prognósticos só no final do jogo é mais fácil. É injusto dizer que erramos agora, A ou B. Mas nesses erros que são mais fáceis de identificar, estão os erros de gestão decorrentes de se colocar a paixão futebolística e as loucuras do futebol à frente de uma gestão sã e rigorosa. O clube viveu muitos anos acima das suas possibilidades, tal como acontece ainda no futebol português em muitos clubes. E acabou por acumular um passivo verdadeiramente impagável. Tínhamos uma dívida de 64 milhões de euros, entre clube e SAD, o que, atendendo depois a contigências em que o clube caiu, designadamente o ter sido despromovido administrativamente dos campeonatos nacionais para os campeonatos distritais, se tornou impossível de pagar. Mesmo que o Vitória continuasse na Primeira Liga, eventualmente seria impossível ou, pelo menos, muito difícil, mas havia uma luz de esperança. Sobretudo, agora com as alterações que estão a ser feitas na Liga com a partilha das receitas televisivas. Mas, mesmo assim, seria muito difícil para o Vitória. Este é um problema crónico do futebol português que vive com orçamentos e esforço financeiro acima daquela que é a real capacidade dos clubes de gerarem receitas para pagarem essas apostas. O Vitória pagou essa fatura e surgiram outros erros já mais personalizáveis de má gestão de um ou outro dirigente. Até, não só de gestão danosa, mas de apropriação e aproveitamento, que não gostaria de aprofundar, mas sabemos todos que houve. O segundo grupo, agora da gestão mais recente, desde 2020, o que identifico como grande erro estratégico, foi ter-se feito uma tentativa de salvar uma SAD que já era impossível de salvar. A SAD tinha uma dívida de 34 milhões de euros, nós tivemos uma grande oportunidade, com a entrada do investidor Hugo Pinto, que investiu 10 a 12 milhões de euros, e que foram todos consumidos por esse abismo que era a SAD. Se tivéssemos logo tido a capacidade de perceber que mais valia insolver a SAD e aproveitar a disponibilidade financeira desse investidor, hoje estaríamos numa situação muito melhor, embora isso naturalmente significasse que tínhamos sido nós próprios a abdicar de continuar nos campeonatos profissionais, o que seria difícil de entender pelo sócios. A tentativa de manter a SAD viva foi sendo feita com o clube na Liga 3 e no Campeonato de Portugal. E eu entendo que teria sido difícil para os anteriores órgãos sociais fazer perceber aos sócios que era mais favorável para o Vitória, insolver a SAD e começar os campeonatos na segunda distrital, como acabou por acontecer, mas já depois de desse dinheiro ter sido perdido. Estaríamos desportivamente onde estamos agora, mas estaríamos economicamente muito melhor se tivéssemos tido capacidade de perceber isto e se tivesse sido possível. Não era só perceber, era também necessário que os próprios adeptos e sócios aceitassem isto. Nada disso era garantido. Por isso é que digo que são os erros estratégicos mais compreensíveis porque são avaliados com estes “prognósticos já no final do jogo” do que os outros do primeiro grupo que referi, que são mais indesculpáveis.
Bola na Rede: Uma questão para fecharmos o capítulo financeiro. Há pouco falou sobre uma “última oportunidade” para o Vitória. Ao dia de hoje, os adeptos do Vitória podem estar mais descansados em relação a um risco de insolvência e sobre o futuro do clube? Ou ainda é prematuro fazer este tipo de previsões/previsões?
Francisco Alves Rito: Digo que esta é a última oportunidade por duas razões: primeiro porque o Vitória está a alienar os ativos que tem, até porque não pode vendê-los duas vezes. Esta é a última oportunidade. Esses recursos têm de servir para sanear o clube e ficar com dívida zero e para o lançar. Não podem servir para outra coisa. Além de que temos também de reformular o estádio. A verba, embora sejam 25 milhões de euros, não é demasiado alargada para dar aqui grande folga. Será à conta, digamos assim. E é também uma última oportunidade porque estamos com um PIR e isso significa que não podemos falhar um PIR. Se falharmos o PIR, a consequência natural é entrarmos na insolvência. Independentemente de depois ser possível ainda uma outra solução, mas já estamos no âmbito de um PIR. Já estamos num patamar em que não deveríamos falhar. Por isso é que é uma última oportunidade. Quanto aos sócios poderem estar descansados… Nunca podemos estar absolutamente descansados nestas coisas, são coisas complexas. Eu acredito cada vez, e nestes últimos dias temos tido muita informação nesse sentido, porque vamos conhecendo os dossiers e as pessoas envolvidas, que toda a gente está de boa fé e quando digo toda a gente, não me refiro só aos órgãos sociais, porque aí é evidente, mas mesmo aas contrapartes com quem o Vitória está a trabalhar, quer a Câmara Municipal de Setúbal, que está empenhadíssima em que este processo urbanístico tenha um desfecho em prazo, ainda neste ano. Acredito que a Câmara gostava de resolver este dossier antes do final deste mandato autárquico para deixar o problema resolvido. Mas também da outra contraparte envolvida que é o investidor com quem temos um contrato de promessa de compra e venda. Temos visto um cumprimento das principais obrigações e as pessoas com quem falámos , quer me parecer, que estão genuinamente bem intencionadas e querem cumprir o contrato e implementar isto em que estamos a trabalhar. Como dizia, não há garantias absolutas porque as coisas são complexas. Podem surgir aspetos que nós, Vitória, não controlamos. Por exemplo, haver algum problema urbanístico… Não é expectável, pelo que conhecemos. Pode também haver algum problema do lado da capacidade económica do investidor. Também não controlamos e é um esforço considerável. Nós, direção, estamos a trabalhar com toda a lealdade com o atual investidor no sentido de lhe dar conhecimento de que estamos à procura de alternativas para o caso de haver alguma dificuldade no cumprimento deste contrato por parte do atual investidor. Estamos em conversações com três grupos consistentes. Num dos casos, o próprio atual investidor também está a par e está também em contactos juntamente connosco, portanto em conjunto. Há a possibilidade de se conseguir fazer alguma coisa em cooperação. Mesmo que entre um novo investidor, não tem de ser contra ou hostil aos atuais pareceres do Vitória e o facto de estarmos a conseguir falar com grupos idóneos e de estar a haver esta abertura para trabalharmos em conjunto com o investidor, faz-nos acreditar que vamos conseguir levar a bom porto este projeto imobiliário e o saneamento do clube porque temos esta perspetiva de haver alternativas se houver alguma insuficiência ou dificuldade da parte dos nossos parceiros deste momento.

FUTURO DO VITÓRIA FC AO NÍVEL DESPORTIVO
Bola na Rede: Francisco, voltando às quatro linhas, o Paulo Martins, atual treinador do Vitória FC, não foi uma escolha da atual estrutura diretiva. Gostava de saber a sua opinião sobre a prestação do treinador e equipa técnica?
Francisco Alves Rito: A opinião está à vista na tabela classificativa. Estamos no primeiro lugar, de forma destacada, mas também nos resultados desportivos. O Vitória FC tem pouquíssimas derrotas, poucos empates e vitórias muito volumosas. O trabalho do treinador Paulo Martins está bem espelhado nos resultados, está a cumprir com distinção que seria o nosso objetivo. Não se pode pedir mais a um treinador. Quanto à perspetiva do próximo ano, que penso que também quer saber a avaliação que fazemos…
Bola na Rede: Claro.
Francisco Alves Rito: A direção tem muita confiança neste grupo de trabalho. O grupo de trabalho não é constituído apenas pelo treinador Paulo Martins. É constituído por uma equipa técnica liderada por Carlos André, uma pessoa com muita experiência no futebol, acima dos distritais. Portanto, uma pessoa dos campeonatos nacionais. Os outros elementos que trabalham com grupo também nos dão muitas garantias. Temos uma solução em termos de grupo de trabalho e de equipa técnica já ao nível da primeira distrital e até ao nível do Campeonato de Portugal, no que diz respeito a alguns aspetos. Portanto, temos muita confiança. Acresce que este treinador, sendo o treinador campeão, já marca pontos no que diz respeito à construção da solução para o próximo ano, como é evidente. Não vou adiantar muito, ainda não chegámos a essa fase, até porque não está o vice-presidente do futebol, Miguel Reisinho, mas estamos muito satisfeitos, muito confiantes com a equipa que temos. A nossa perspetiva é a de que tudo será feito com a maior tranquilidade quanto à liderança do grupo de trabalho, no que diz respeito a treinadores e equipa técnica.
«Temos pelo menos dois grupos muito interessados, de alto nível, em trabalhar desportivamente com o Vitória FC e isso também vai facilitar a aposta na nossa formação e aproveitarmos melhor esses recursos».
Bola na Rede: O Vitória FC, além de ser um histórico do futebol nacional, sempre foi uma instituição que conseguiu lançar vários jovens da formação. A “cantera” faz parte do seu projeto?
Francisco Alves Rito: Claro que sim, a aposta na formação é estruturante. Reconheço que temos um problema: temos escalações de formação, dos Sub-17, Sub-19, a participarem em campeonatos nacionais muito acima do nível onde está a equipa principal, que está ainda nos Distritais, portanto isso coloca-nos alguns desafios de atratividade de jovens atletas que ambicionam estar em campeonatos mais acima. Compreendemos isso, é natural. Mas queremos proporcionar as condições para as equipas técnicas e haver maior ligação com a situação com o Futebol de Formação e Futebol Sénior e acreditamos que vamos conseguir ter maior eficácia nesse domínio da atratividade para os nossos jovens atletas. Aí, reconheço que temos um desafio em que estamos a trabalhar. Mas, por outro lado, temos um enorme valor nas camadas jovens e na nossa formação. Ainda agora, nesta época, acabou de sair do Vitória FC para o Sporting, o Duarte Rosa, um atleta nosso dos Sub-17. Era capitão de equipa. Isso demonstra que os grandes do futebol português continuam a ver no Vitória FC “pérolas” em que querem apostar. Não podia haver maior demonstração da qualidade que aqui conseguimos descobrir e valorizar. Vamos trabalhar nisso. Além disso, o Vitória FC tem também em perspetiva o estabelecimento de parcerias com grupos na vertente desportiva. Temos pelo menos dois grupos muito interessados, de alto nível, em trabalhar desportivamente com o Vitória FC e isso também vai facilitar a aposta na nossa formação e aproveitarmos melhor esses recursos.
Bola na Rede: O Vitória FC é um clube que vai além do Futebol. Quais é que são os planos que tem no imediato e as prioridades nesta fase?
Francisco Alves Rito: As prioridades são a de assegurar uma continuidade tranquila e garantindo confiança às pessoas no trabalho que estão a fazer. Procuraremos que nada lhes falta ao que estão habituadas: são as condições mínimas para o funcionamento, mas queremos também reforçar essas condições. Isso passa agora numa primeira fase de transmitir essa confiança às pessoas no que estamos a fazer e, depois, quando percebermos melhor que recursos é que o Vitória FC e começarem a haver resultados destas diligências que andamos a fazer, temos aqui um enorme esforço do lado da gestão para aumentar as receitas e as perspetivas são boas. Havendo melhor condição financeira no Vitória FC, teremos recursos apostar na melhoria das condições de cada uma destas modalidades. Há também aqui algum trabalho de reorganização interna na relação do clube com todas as modalidades. Alguns aspetos ainda não foram concluídos do bom trabalho das direções anteriores nessa matéria: centralização da gestão, integração plena de todas as modalidades e essa também é uma prioridade em que estamos concentrados e que procuramos concluir em breve, nos próximos meses.
RELAÇÃO COM OS SÓCIOS DO VITÓRIA FC
Bola na Rede: Francisco, estamos a chegar ao final da entrevista. Vamos tocar num tema que será o mais importante para si, que são os sócios e a relação com os sócios: já falou sobre a iniciativa no próximo jogo do Vitória FC, pergunto, além desse plano, se existem mais planos para promover este reencontro, digamos assim, entre clube e adeptos nos próximos tempos. Quais é que são os planos para envolver mais a massa associativa com o Vitória FC?
Francisco Alves Rito: São dois níveis distintos: procurar que o clube chegue melhor aos seus diversos públicos. Quanto ao público principal, os nossos sócios, a nossa preocupação é envolver e permitir que participem. Esclarecer o melhor possível, a transparência é um dos nossos princípios principais e nesse âmbito até gostava de anunciar aqui, através da nossa entrevista, que nós, órgãos sociais, a direção tencionar promover em breve uma sessão de esclarecimento com os associados para lhes apresentar o projeto que temos. Ainda não é conhecido por parte dos adeptos: queremos fazer uma sessão de esclarecimento em que possamos apresentar o projeto e esclarecer as dúvidas, trazendo alguns elementos técnicos, nomeadamente o arquiteto responsável pelo PIP. O PIP só foi entregue agora na Câmara Municipal [sexta, dia 21 de março] e ainda não houve tempo, mas é uma preocupação nossa para promover o encontro com os sócios. E optamos porque é a forma mais adequada. Não será aqui na entrevista ao Bola na Rede, ou a outro meio de órgão de comunicação social, que podemos prestar um bom esclarecimento às pessoas a quem devemos esse esclarecimento, que é aos associados. É a eles que temos de apresentar, em primeira-mão, todas as informações. Vamos fazer essa apresentação aos associados na forma de uma sessão de esclarecimento em breve. O esforço que fazemos de aproximar os associados passa também por apostar em comissões de trabalho: nós temos um princípio de delegar e envolver ao máximo os associados do clube nos trabalhos do dia-a-dia do Vitória FC, até mesmo na gestão. Não é necessário estar nos órgãos sociais do clube para participar, criámos mais de uma dezena de comissões para os diversos desafios e essas comissões estão abertas à participação dos sócios. Basta inscreverem-se para passarem a ser participantes ativos na vida do clube. Essas comissões têm funcionado muito bem. Fizemos uma tomada de posse como não se via há muitos anos no clube, com cerca de 400 pessoas presentes. Mesmo a festa do Bonfim, é trabalho dessas comissões, que estão a trabalhar no processo do estádio, na fixação de publicidade, na conservação de equipamentos… Em termos jurídicos, há muita coisa a ser desenvolvida e queremos que os sócios estejam sempre por dentro na participação. Temos também já no ativo um esforço de angariação de sócios. Não é ainda uma campanha de angariação, mas é um apelo e um trabalho proativo dos órgãos sociais e de associados de terem sempre presente a necessidade de conseguirmos trazer outros amigos e familiares para associar ao Vitória. Um aumento da massa associativa tem de ser o objetivo de todos e isso já está a ser feito. Já notamos que há um aumento do número de associados. Neste entusiasmo, veremos depois, mais à frente, estamos a ponderar os processos estatutários, com o arranque da campanha de sócios para fazer uma promoção no que diz respeito ao pagamento das quotas. Temos de ver quando e como poderemos avançar. Pretendemos fazer campanha de sócios para que o Vitória passe dos 12 mil para os 15 mil sócios. É esse o objetivo que iremos fixar nessa campanha.
Bola na Rede: E o outro nível?
Francisco Alves Rito: Quanto a cidade, é o segundo nível. É um público diferente. Já não será o público dos associados, que é o público mais direto. Mas é uma comunidade que nos interessa bastante. Queremos que o Vitória tenha mais adeptos, mesmo que não sejam sócios. Depois, com certeza, haverá conversão do adepto em sócio, mas quantos mais adeptos tiver, mais próximo estará de ter sócios e maior poderá ser a receita de bilheteira. Há muitos adeptos que vão aos jogos e não são sócios. Temos também, com as comunidades que compõem as cidade, estabelecer relações: os comerciantes poderem promover o Vitória e terem uma ligação com o clube, nas dinâmicas comerciais, na venda de merchandising, na exposição de camisolas… Queremos muito que os comerciantes da baixa de Setúbal e de outros espaços da cidade percebam que faz toda a diferença ter uma camisola afixada na rua: para quando os turistas passa, para quando os setubalenses passam… O Vitória estar presente nas nossas zonas urbanas e noutras. Não é uma prática que existe muito e gostava de fazer esse apelo. Queremos que os empresários da cidade se lembrem do Vitória. O Vitória é um porta-estandarte da nossa cidade e precisa da ajuda de todos. E queremos ter também, da parte das entidades oficiais, quer das autarquias, quer das direções da administração central, sempre a melhor abertura para o Vitória. Que percebam que o Vitória FC tem uma direção empenhada e que tenha como princípios a honestidade, transparência e rigor. E que reconheçam que o Vitória FC tem novamente a credibilidade necessária para voltarem a fazerem coisas com o Vitória.
«Que percebam que o Vitória FC tem uma direção empenhada e que tenha como princípios a honestidade, transparência e rigor».
Bola na Rede: Para fechar, uma mensagem que queira deixar para os adeptos do Vitória FC?
Francisco Alves Rito: A minha mensagem passa por um lugar comum que queria que se transformasse numa coisa que toque no coração das pessoas: “Vamos todos ajudar o Vitória FC a chegar aos lugares que são seus por direito“. Isto parece um chavão, mas é algo que tem de ser traduzido em empenho concreto. Em vontade genuína de ajudar. Os adeptos podem transformar-se em sócios. Os sócios podem ajudar mais ativamente. Todos juntos vamos convencer os outros, a comunidade à volta, o empresários, as empresas, as entidades oficiais… A ajudarem o Vitória FC a desenvolver a sua atividade e a dar a volta a este momento que ainda é crítico. Se tudo isto funcionar, cada um deste patamares se cumprir, com certeza de que vamos conseguir. A mensagem final é: “O Vitória precisa de todos e todos têm de ouvir esta mensagem e não interpretá-la como se fosse mais uma vez o apelo que todos fazem. Tem de ser agora porque é agora que queremos começar um caminho ascendente“.
Bola na Rede: Francisco, obrigado pela entrevista.
Francisco Alves Rito: Muito obrigado eu pela vossa atenção. Obrigado, um abraço.
Entrevista realizada por Mário Cagica Oliveira e Ricardo João Lopes