Patrícia Sampaio nunca mais vai ganhar uma medalha como underdog, como fez nos Jogos Olímpicos de Paris. A partir daí, criou-se uma expectativa, uma convicção própria das soberbas figuras que nos convencem tanto como elas próprias estão convencidas de que podem fazer o Evereste cair de costas no chão se assim entenderem. Parte disso, deve-se ao olhar bravio, extasiado, possuído que, mais cerrado que o cinturão negro, veste por cima do kimono.

Empoleirada no primeiro lugar do ranking (-78 kg), todas as adversárias sabem com o que contar vindo dali. É a ordem natural das coisas. Um terceiro lugar nos Jogos Olímpicos seguido de um título europeu eram indícios de que o Mundial tinha uma clara perseguidora e que a judoca de Tomar podia ser a primeira mulher portuguesa a ser campeã do mundo.

Ao superar a croata Petrunjela Pavić e a sul-coreana Minju Kim, Patrícia Sampaio tinha já garantido a melhor prestação de sempre em Mundiais, já que em Abu Dhabi (2024) e Doha (2023) não tinha ido além do segundo combate. Em Budapeste, as dificuldades começaram a surgir frente à brasileira Karol Gimenes, mas, com a paciência necessária, resolveu a passagem às meias-finais no golden score.

A proatividade que lhe sustenta o judo enérgico, que procura a projeção desde os primeiros momentos dos combates, rasteirou-a contra a frieza de Anna Monta Olek. Patrícia Sampaio ficou limitada pelos dois castigos que recebeu (ao terceiro é penalizada com a derrota). A 35 segundos do final, Olek conseguiu uma micro pontuação, um yuko, e começou a jogar às escondidas fora da área de combate até que o tempo se esgotou.

No combate pela medalha de bronze, a postura foi a de sempre diante da Ma Zhenzhao. Apenas mais ponderada e eficiente nos gestos. Neste caso, foi a chinesa a ficar afogada em shidos, pisando mesmo o limite, o que deu o triunfo à portuguesa. A japonesa Kurena Ikeda partilhou o último lugar no pódio com a tomarense, enquanto que Alice Bellandi superou Anna Monta Olek numa emotiva final.

Assim, Patrícia Sampaio conquistou a única medalha da comitiva nacional que teve os Mundiais em risco devido às dívidas da Federação Portuguesa de Judo. Campeã da Europa, vencedora do Grand Slam de Paris e terceira classificada no Grand Slam de Tiblissi, na questão sobre qual o melhor ano da carreira de Patrícia Sampaio, 2025 começa a não ter concorrência. Insaciável como é, vai querer repetir as conquistas que alcançou e repetir a tentativa de chegar àquilo que não conseguiu.

À entrada do pavilhão da Sociedade Filarmónica Gualdim Pais há recortes de jornal à entrada que começam a ficar amarelecidos. Um quadro de cortiça ostenta os dias de glória em que Patrícia Sampaio foi notícia. Uma das manchetes tem parangonas que dizem “quero muito ser campeã do mundo”. Esperemos que o baú das memórias tenha espaço no dia em que esse desejo se tornar defunto e os pioneses tenham que fazer halterofilismo com os títulos dos jornais da manhã a Patrícia Sampaio se sagrar campeã do mundo. O objetivo está mais do que traçado. Talvez um dia possa lá chegar.