
Este domingo há festa da Taça, com a final entre Benfica e Sporting. Será um duelo como não se via há quase 30 anos (29, para ser mais preciso) nesta fase da prova, o que nos leva a fazer uma pequena viagem pelo passado no sentido de reviver o jogo decisivo de 1996.
Foi um encontro que ficou marcado pela morte de um adepto do Sporting- veja a nossa reportagem sobre o tema -, o que acabou por abafar o que se passou dentro das quatro linhas. De resto, a verdade é que não serão poucos os adeptos a «esquecerem-se» do resultado desse duelo, fruto do que sucedeu tragicamente fora das quatro linhas.
Mas a verdade é que o Benfica venceu o rival Sporting por 3-1 e adicionou ao seu palmarés mais uma Taça de Portugal. O zerozero tentou relembrar esse jogo repleto de emoções e foi ao encontro do argentino Mauro Airez, autor do primeiro golo da partida, aos 9 minutos, perto da altura em que sucedeu o assassínio de Rui Mendes, adepto do Sporting atingido por um very light.
Natural de Buenos Aires, Mauro jogou em Portugal entre 1991 e 1999, tendo representado Belenenses, Benfica, Estrela da Amadora e Estoril Praia. Depois de ter terminado a carreira, voltou para território luso em 2013 e não mais saiu. Atualmente trabalha no meio audiovisual, onde é técnico de iluminação de televisão e cinema.
Entre juras de amor a Portugal e histórias desta sua nova vida profissional, as memórias ainda estão bem presentes.
«O Jamor estava cheio, parecia uma bandeira portuguesa. Estava uma loucura. Quando colocámos a bola no meio campo e eu olhei para a equipa do Sporting, eu senti uma confiança enorme. Olhei para o João Vieira Pinto e disse que íamos vencer. Era a última oportunidade de salvar uma época atribulada, com tudo o que tinha acontecido. A equipa do Benfica não estava bem, mas estávamos mesmo focados. Com o meu golo, na 1ª parte, cresceu ainda mais a confiança e, pouco depois, o João faz o 2-0 e tínhamos o jogo controlado», começa por dizer.
«Inicialmente nem nos apercebemos do que aconteceu com o adepto do Sporting. Por isso é que continuámos com o jogo. Fizemos a 1ª parte sem nos apercebermos do que aconteceu. Era um dia de muito calor e quando fomos para intervalo o primeiro a ir para o túnel fui eu, porque estava cheio de sede. Fui a correr para o balneário e quase fui atropelado pela ambulância que o levava. Apercebemo-nos que tinha acontecido algo, mas não sabíamos o quê. Quando regressámos é que vimos o clarão na bancada. Mais tarde fiquei a pensar 'Se eu não tivesse comemorado com um mortal, se calhar a pessoa estava viva'», acrescenta, com tristeza na voz.
Apesar de todo o aparato (natural) causado pelo sucedido na zona de adeptos do Sporting, o jogo prosseguiu, «como se nada fosse». Ao intervalo, quando o Benfica já vencia por 2-0, no entanto, houve uma reunião de emergência sobre o desfecho do encontro, com os comandantes da polícia, o primeiro-ministro, o presidente da Federação Portuguesa de Futebol, Gilberto Madail, e os presidentes dos clubes, José Roquette e Manuel Damásio.

Apesar de algumas partes envolvidas, como o presidente Jorge Sampaio, terem defendido a interrupção imediata do jogo, as forças policiais entenderam que o mais seguro seria finalizar o jogo, não entregar o troféu e retirar do recinto, separadamente, os adeptos de cada clube com algum tempo de distância, para evitar confrontos.
«Foi falado ao intervalo e estava na iminência de se interromper o jogo. É um pau de dois bicos. Podia haver mais confrontos porque seria um jogo interrompido, com 45 minutos por jogar, quando estávamos em vantagem. Jogando noutro dia, a dinâmica não seria a mesma. Por outro lado, ainda bem que continuámos. No entanto, foi uma final triste porque não houve festa e não levantámos a taça no estádio. Podia ter corrido bem ou mal, se interrompessem», aponta Mauro.
29 anos depois, um dos heróis dessa histórica (e trágica) final não poderá estar presente este domingo no estádio, mas não esconde o apoio e amor pelo Benfica: «Verei o jogo pela televisão, porque estarei nos Açores em trabalho. Estarei a torcer pelo Benfica, sempre. Fiquei com um carinho especial. Quem passa pelo Benfica, é Benfica sempre. Tem uma mística impressionante. Também tenho um carinho muito especial pelo Belenenses, o clube que me abriu as portas aqui em Portugal. Tive a felicidade de passar pelo Benfica e é enorme em todos os sentidos.»