Qual a prevalência da esquizofrenia?

Estima-se que, em Portugal, haja cerca de 48 mil doentes com esquizofrenia. Estudos internacionais apontam para 1% da população a nível mundial. É uma doença muito limitativa no dia a dia e ainda alvo de estigma.

A doença é causada por sintomas positivos e negativos. Os sintomas positivos, de forma básica, são os delírios e as alucinações – são uma quebra de contacto com a realidade. O mais comum é o doente ter a certeza absoluta de que está a ser perseguido e ouvir vozes que não estão a ser emitidas. Estes sintomas causam uma grande disfunção. Há, ainda, os sintomas negativos, caracterizados por falta de motivação, falta de iniciativa e pela dificuldade em contactar com terceiros e em interpretar os outros. Nalgumas fases da doença está presente aquilo a que chamamos concretismo, isto é, existe dificuldade em lidar com pensamentos abstratos, o que também vai ter repercussões na interação social.

Desafios que também afetam a família…

Sim, o impacto é para todos.

“A expansão das unidades locais de saúde (ULS) estão a facilitar mais essa transição entre Psiquiatria da Infância e Adolescência e a Psiquiatria de Adultos”

Tem-se apostado mais no diagnóstico precoce ou ainda há muito a fazer nesta área?

Temos evoluído de alguma forma, nos últimos tempos. Por exemplo, mesmo os médicos de família estão muito capacitados para suspeitar da doença e para referenciarem, atempadamente, o doente para consulta de Psiquiatria. Mesmo assim, ainda há vários passos a dar no que diz respeito ao diagnóstico precoce. É também importante fazer campanhas informativas para a população saber quais são os sintomas e procurarem os serviços de saúde. É preciso, também, dar conhecimento à população acerca de alguns fatores de risco que podem contribuir para o desenvolvimento da esquizofrenia.

Quando o diagnóstico surge na adolescência, como avalia a transição entre a Psiquiatria da Infância e Adolescência e a Psiquiatria de Adultos?

Também já se está a melhorar neste campo, apesar de ainda haver situações em que estes doentes acabam por se sentir como numa ‘terra de ninguém’. A expansão das unidades locais de saúde (ULS) estão a facilitar mais essa transição entre Psiquiatria da Infância e Adolescência e a Psiquiatria de Adultos.

“Com estes antipsicóticos já não se veem as pessoas a babar ou a arrastar os pés, uma imagem que muito contribuiu para o estigma”

E o acompanhamento a nível comunitário?

Depende da região. Nalgumas até se tem a possibilidade de o enfermeiro se deslocar a casa dos doentes. Noutras, não. Infelizmente, não existe uma uniformização, apesar de estarmos a caminhar nesse sentido com as novas equipas comunitárias e saúde mental para adultos e para a infância e adolescência, que contam com o apoio do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).

Os tratamentos têm evoluído muito?

Tem havido evolução, mas a maior conquista foi o acesso aos antipsicóticos de última geração, de forma gratuita, no SNS, a partir de 2020. Apesar destes medicamentos serem similares aos anteriores no controlo dos sintomas positivos, têm a vantagem de não provocarem tantos efeitos secundários. Com estes antipsicóticos já não se veem as pessoas a babar ou a arrastar os pés, uma imagem que muito contribuiu para o estigma. Atualmente, uma pessoa com esquizofrenia pode ter uma vida ativa e funcional, com o tratamento adequado. Também já se aposta mais em programas de reabilitação psicossocial, que melhoram a qualidade de vida destas pessoas, e dos seus familiares, e evitam internamentos.

Ainda existe um forte estigma, vendo-se estes doentes como violentos e sem qualquer capacidade para a vida em sociedade. De que forma a campanha “Vivo com esquizofrenia. E então?” pode combater estes mitos?

Campanhas como esta são essenciais para que se combata o estigma. É preciso explicar que não são doentes violentos, na maioria das vezes.

Maria João Garcia

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