
Com a direita (quase) unida, o Parlamento aprovou, sem surpresa, as alterações ao regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional, que vão apertar as regras para a imigração e o reagrupamento familiar. PSD, CDS, Chega votaram a favor da lei dos estrangeiros, responsabilizando os anteriores governos pelo “descontrolo” da imigração, enquanto a IL se absteve, desta vez, em votação final global. Já os restantes partidos à esquerda votaram contra e apelaram ao veto do Presidente da República.
Ao longo do debate desta quarta-feira, a oposição criticou a ausência de pareceres e audições, falando num processo legislativo marcado por vários erros e atropelos. “O que nos apresentam é uma vergonha, continua a ser inconstitucional, e temos de ter clareza de rejeitar alterações de última hora que põem em causa os princípios do Estado de Direito Democrático”, começou por criticar o socialista Pedro Delgado Alves.
“Não vale tudo”, vincou. “Pode o Governo ter direito às suas alterações, à sua nova política migratória, pode deitar fora aquilo que se fez ao longo de um ano, mas, por favor, não fiquem sequestrados pela extrema-direita!”, clamou ainda Delgado Alves, queixando-se da escolha do Chega como parceiro preferencial do Governo.
Antes da votação, o líder da bancada socialista, Eurico Brilhante Dias, chegou a pedir ao Executivo para retirar a proposta do guião, apelando à “lealdade institucional”. Mas Hugo Soares, líder da bancada social-democrata, recusou de imediato o repto e lamentou o “número miserável” do PS. Ainda pelo PSD, António Rodrigues devolveu as farpas à esquerda, considerando que esta se autoproclama “defensora do humanismo” e insiste com audições, quando a matéria da imigração foi “a mais discutida nos últimos 15 meses” em Portugal, face à situação deixada pelo Governo anterior. “A urgência exige-se por anos de incapacidade de legislar e decidir. Queriam apenas uma coisa: continuar a viver no mesmo pântano em que estávamos a viver”, atirou.
Na mesma linha, o centrista João Almeida defendeu que a alteração à lei da imigração é “necessária”, “urgente” e vai no “sentido certo” perante uma situação de imigração que é da “absoluta responsabilidade” do PS.
Pelo Chega, a deputada Vanessa Barata responsabilizou também os anteriores governos socialistas por uma política de “portas escancaradas”, “sem critério e controlo”, com consequências para os portugueses. “Hoje temos bairros inteiros em colapso, serviços públicos saturados, a insegurança crescendo e uma precariedade para os portugueses”, assinalou.
Já o liberal Rui Rocha concordou que a “gravidade da situação” de imigração herdada pela AD exigiu que o partido acompanhasse um conjunto de medidas neste âmbito, mas não deixou de arrasar o processo legislativo. “É absolutamente inadmissível. O PSD substituiu documentos, substituiu propostas legislativas à 24ª hora. Trata-se de uma legislação melindrosa que não teve no seu processo legislativo todas as garantias”, queixou-se Rocha para justificar a mudança de posição dos liberais, que tinham votado a favor das alterações na sexta-feira na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Pressão sobre Belém
À esquerda, o Livre condenou uma lei “injusta e feita à pressa”, com fins mal intencionados, de mão dada com a extrema-direita. “É uma lei que é feita sem ouvir ninguém, num processo de urgência, que foi imposto por uma maioria arrogante”, notou Paulo Muacho.
A líder parlamentar comunista, Paula Santos, considerou, por sua vez, que as alterações à lei não revelam uma “cedência ao Chega”, mas sim a “agenda retrógrada” de PSD e CDS, de “atacar” direitos de imigrantes que procuram o nosso país em busca de uma “vida melhor”, tal como tantos portugueses procuram uma vida melhor noutros países.
Também a deputada do PAN, Inês de Sousa Real, lamentou um processo cheio de “atropelos” e ao “arrepio” do que devia ser uma discussão mais alargada e consensual na especialidade. E admitiu ter o desejo secreto que o Presidente da República tenha o “bom senso” que a bancada do PSD “não teve” e peça a fiscalização da constitucionalidade deste diplomas. “Todos nós reconhecemos que aquilo que são os fluxos migratórios e o que é a imigração tem de cumprir a lei, mas também tem de ser humanitário”, rematou.